terça-feira, 22 de outubro de 2013

Ilegalidade de investigação de crimes comuns pela Polícia Militar - estudo de caso


 




Resumo: A prática de atos de investigação próprios de polícia judiciária possui previsão constitucional específica. Em caso paradigmático da jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, a egrégia corte anulou processo criminal movido contra indivíduo que havia sido preso, em virtude de flagrante delito de tráfico de drogas ilícitas, após cumprimento de ordem judicial de buscas realizado pela Brigada Militar. Com base na jurisprudência das cortes superiores, houve a anulação do procedimento. O presente estudo abordará a fundamentação constitucional que amparou a tal decisão.

Palavras-chave: Direito Constitucional. Segurança Pública. Investigação. Crimes Comuns. Polícia Civil. Polícia Militar. Nulidade.

Sumário: Introdução; 1. A Decisão do Egrégio Tribunal Gaúcho; 2. Da Inviolabilidade do Domicílio e da notitia criminis Anônima; 3. Das Provas Ilícitas; 4. Do Devido Processo e da Legitimidade Constitucional para Investigar; Conclusão.



Introdução


O presente trabalho tem a pretensão de analisar caso específico, julgado pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, a respeito de investigação ilegalmente produzida sobre delito de tráfico de drogas ilícitas. De forma objetiva, trataremos do aspecto constitucional do acórdão relacionado, tendo sempre por mote a busca de uma visão jus fundamental do caso.

Primeiramente, vamos analisar a decisão exarada pela corte referida, colacionando trechos do processo e do acórdão. Como forma de abordagem mais direta, utilizaremos de parte do voto vencedor, salientando que a tese abarcada pelo Eminente Relator foi basicamente uma discussão de fundo constitucional.

Em um passo seguinte, analisaremos o conteúdo do decisium frente à garantia constitucional à privacidade e à inviolabilidade do domicílio, bem como da vedação ao anonimato. Especificamente quanto a esta última, utilizaremos jurisprudência das cortes superiores para reinterpretar a voto vencedor, embasando os fundamentos elencados pelo eminente relator com o Direito Constitucional.

Em seguida,avaliaremos o caso estudado frente à vedação constitucional ao uso de provas ilícitas, especialmente em sede de processo penal. Passaremos a discorrer sobre as implicações da ilegitimidade da polícia militar para praticar atos de investigação, nos delitos comuns, terminando por discorrer a respeito do devido processo legal, no direito criminal, bem como da garantia à dignidade da pessoa humana no direito pátrio.

Por fim, realizaremos a análise final do caso investigado, do processo penal e das garantias do acusado, terminando por realizar um cotejo com a decisão da corte gaúcha e a doutrina e jurisprudência das cortes superiores.



1. A Decisão do Egrégio Tribunal Gaúcho


O caso a ser avaliado por este ensaio vem por retratar uma discussão jurídica recente e de grande importância para a sociedade democrática. Na atual conjuntura brasileira, a criminalidade tem sido constatada em cifras alarmantes, fazendo com que regiões do estado do Rio Grande do Sul, antes caracterizadas pela tranquilidade e segurança, passassem a ser objeto de preocupação pelos órgãos de segurança pública.

Delitos que antes eram referidos com característicos de regiões metropolitanas, com o passar dos anos tornaram-se um problema geral, assolando inúmeros municípios gaúchos. O tráfico de drogas ilícitas ganhou corpo, tornando-se uma prática comum também no interior, como no caso ora referido.


Em especial na cidade de Ijuí-RS, a traficância de drogas ilícitas se tornou um relevante ponto de debate social, acossando as autoridades de segurança para que medidas de enfrentamento sejam postas em prática. No entanto, pelo afã de participar de forma contundente, atores sociais que possuem funções específicas na Constituição Republicana passaram a realizar atividades outras que não as devidamente expressas no texto constitucional.

Neste ponto, o processo ora avaliado tratou de diligências efetuadas por policiais militares em busca de provas e de enfrentamento de delito de natureza comum: tráfico de drogas ilícitas. Vejamos a ementa da decisão:

Ementa: HABEAS CORPUS. DEFERIMENTO DE MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO TENDO POR ÚNICA BASE UMA NOTITIA CRIMINIS ANÔNIMA. SOLICITAÇÃO DE MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO PELO COMANDANTE DA POLÍCIA MILITAR E EXECUTADO PELA POLÍCIA MILITAR, EM ATIVIDADE DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DE COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM. ATRIBUIÇÃO DA POLÍCIA CIVIL. ARTIGO 144 E SEUS PARÁGRAFOS, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ILICITUDE PROBATÓRIA RECONHECIDA. PRECEDENTES DO STF E STJ. 1. No caso concreto, diante de uma notitia criminis anônima, o Comandante da Polícia Militar sugeriu ao Ministério Público a solicitação de um mandado de busca e apreensão, quem o requereu à autoridade judicial. Deferido, o mandado de busca e apreensão foi entregue à polícia militar, quem o executou, em atividade de investigação de atribuição da polícia civil. Ministério Público e polícia civil não acompanharam a execução. 2. A notitia criminis anônima possui entidade para desencadear uma averiguação do fato noticiado, mas não se reveste de potencialidade suficiente para dar suporte a medidas de investigação que interfiram de forma insidiosa em direitos fundamentais, como no caso em tela, com o ingresso em residência de cidadãos, sem qualquer outra averiguação a dar credibilidade ao anonimato, vedado pela Constituição Federal. Nesse sentido já decidiu o STF - precedente citado no corpo do voto. 3. Segundo o artigo 144 e seus parágrafos, da Constituição Federal, a polícia militar não possui atribuição para investigar infrações criminais, inserindo-se nessa ausência de funcionalidade, o cumprimento de mandado de busca e apreensão, em atividade investigatória de infração criminal de competência da Justiça Comum. ORDEM DE HABEAS CORPUS DEFERIDA, POR MAIORIA. (Habeas Corpus Nº 70047333448, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nereu José Giacomolli, Julgado em 15/03/2012)



2. Da Inviolabilidade do Domicílio e da notitia criminis Anônima


Ao analisarmos o acórdão em estudo, temos por base fundamental da decisão, o respeito a direitos fundamentais dos investigados. Antes mesmo de se enfrentar a problemática do serviço policial prestado, os nobres julgadores asseveraram que o fato apresentado na corte, pela via do mandamus, tratava-se de ato atentatório à vedação do anonimato, cuja previsão constitucional resta sediada no art. 5º, inciso

Segundo a Constituição Republicana, art. 5º, inc. XI: “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”. No caso em estudo, os policiais militares efetuaram buscas domiciliares devidamente autorizados por um juiz de direito, durante o dia, tendo logrado êxito em encontrar drogas ilícitas na posse do investigado.

Entretanto, como bem explicitado, parte-se do pressuposto que todo cidadão brasileiro goza do direito-garantia à inviolabilidade de seu lar.  É vedada a intromissão desautorizada de qualquer ordem, seja de particular ou do Estado, somente sendo permitida mediante o cumprimento de medidas também previstas no texto constitucional. Tal direito possui suas bases na privacidade do indivíduo, que, segundoBRANCO[1], delimita o domicílio como sendo o espaço físico no qual aquele não deve sofrer intromissão, devendo gozar de tranquilidade em sua vida íntima.

Neste ponto, válido é saber quais as condições em que se deu à alegada “prisão em flagrante delito”, objeto do remédio constitucional analisado pelo Egrégio Tribunal. Conforme explicitado na ementa, os policiais militares “flagraram” o indivíduo acusado, na posse de substância entorpecente, no interior de sua morada. Porém, importa lembrar que a diligência levada a efeito pelo comandante da Brigada Militar teria sido sustentada por ordem judicial, devidamente exarada pela corte local. Superficialmente, poder-se-ia pensar que a medida tomada pelos policiais militares estaria sob o manto da estrita legalidade constitucional. 

Todavia, a referida medida esteve amparada por decisão judicial eivada de nulidade, por força de contaminação da prova carreada aos autos do processo. Como bem apontado pela Câmara Recursal, no voto vencedor, a origem da investigação sobre o suposto tráfico de drogas esteve baseada em “denúncia anônima”, que teria motivado aos policiais militares, por via de seu comandante, a buscar a chancela judicial para efetivarem buscas domiciliares. Segundo a doutrina[2] e a jurisprudência[3], a Constituição Federal veda o anonimato, o que faz necessário que toda e qualquermedida judicial e administrativa seja sempre escudada com um mínimo de provas, de forma que não se concebe a existência e o início de qualquer procedimento e processo tão-somente pelo recebimento de denúncia apócrifa.

Vejamos o voto do Desembargador Nereu Giacomolli, referentemente ao exposto:

A decisão transcrita reitera o entendimento antes firmado por ocasião do julgamento da Questão de Ordem no Inquérito 1957, no qual restou vencido o Ministro Marco Aurélio e assentada a orientação quanto à validade da investigação e da ação penal quando presentes nos autos outros elementos informativos ou probatórios além da denúncia anônima.

Em síntese, depreende-se do entendimento da Suprema Corte que as denúncias anônimas têm sua eficácia limitada à provocação da autoridade policial, que ao tomar conhecimento do seu conteúdo tem o dever de diligenciar para averiguar a veracidade dos fatos denunciados. Não basta, por si só, isoladamente, a amparar o início de uma investigação formal, seja através da abertura de um inquérito policial, seja através da adoção de medidas cautelares potencialmente restritivas de direitos e liberdades individuais, como a busca e apreensão, a interceptação telefônica e a prisão cautelar, por exemplo.

Assim, também por esse fundamento, entendo imprescindível o reconhecimento da ilicitude das provas obtidas no curso da fase preliminar, pois ilegalmente deferida a busca e apreensão com base exclusivamente em uma “denúncia anônima” que não está nos autos e sequer foi reduzida a termo. De fato, de concreto, há nos autos apenas uma referência do Comandante da Brigada Militar a uma informação anônima, o que é nitidamente insuficiente a embasar a autorização de busca e apreensão.[4]

Segundo o Superior Tribunal de Justiça[5], não se pode permitir que o processo penal se iniciasse maculado por qualquer forma de ilegalidades, sendo remansoso em seu repertório de decisões, que a denúncia anônima não pode basear qualquer expediente investigatório, seja ele oriundo de qualquer instituição com tais atribuições. Mais além, não se permite, segundo a Corte Superior[6], que expedientes que possam a vir infringir direitos fundamentais sejam autorizados por via judicial sem que exista uma fundamentação preliminar da investigação.

Por força do entendimento referido, temos que, como muito bem observado no acórdão, toda a investigação veio a tomar corpo sem um mínimo probatório cabível. A decisão autorizativa para as buscas se originou em ofício da Brigada Militar, escudado com parecer positivo do Ministério Público, sem nem ao menos ser colacionada uma prova testemunhal, por exemplo. Logo, tratou-se de medida cautelar despida da mínima “justa causa”, passível de ataque por via do mandamus, como entende FELDENS e SCHMIDT[7]:

A prematura sustação de uma ação penal já se revela, em si, como uma medida que se pode considerar grave, porquanto a impedir o seu regular processamento, findo o qual a matéria estaria apta a exame. A realidade prática, nada obstante, fez constatar que em situações determinadas (v.g., a manifesta atipicidade do fato apontado como delituoso ou ausência de um conteúdo probatório mínimo acerca da autoria delitiva, ou mesmo sua defeituosa imputação) nada justificaria o desenvolvimento da ação penal.

Por fim, segundo o Supremo Tribunal Federal[8], em entendimento que vem a corroborar com o referido posicionamento da jurisprudência, nem mesmo a instauração de inquérito policial poder-se-ia admitir sem que houvesse outras diligências preliminares, para o suprimento da ineficácia e da vedação ao uso de denúncias anônimas. No caso em tela, como veremos adiante, tratou-se de investigação ilegal e praticada por servidores não legitimados para tal desiderato.



3. Das Provas Ilícitas


Dando sequência a análise do decisium, faz-se necessário abordar a existência de provas ilícitas e suas consequências no deslinde da causa. Conforme a Carta de 1988, art. 5º, inciso LVI: “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos;”.

Voltando ao ponto analisado anteriormente, segundo o voto vencedor do acórdão, haveria nulidade da instrução probatória, por via de contaminação das provas obtidas em sede do flagrante delito (apreensão de drogas ilícitas), eis que diretamente derivadas de atos praticados por policiais militares em desrespeito à legalidade constitucional.

Nesta esteira, sendo inadmissível o início de qualquer procedimento persecutório somente baseado em denúncia anônima, temos por uma consequência lógica a total impropriedade da decisão judicial atacada pelo mandamus. O magistrado, mesmo baseado em parecer ministerial favorável, jamais poderia ter se abstido de verificar a origem da representação por buscas domiciliares, desacompanhadas de um mínimo substrato probatório. Vejamos a doutrina:

O procedimento de busca deve satisfazer as garantias do Estado de direito ( a chamada “conformação do procedimento pelos padrões do Estado de direito”). Efectivamente, as normas que regulam o procedimento da busca policial não são normas de caráter secundário, juridicamente irrelevantes para a legalidade ou ilegalidade da operação da busca. Todas as exigências de procedimento que têm diretamente que ver com as garantias dos cidadãos devem ser devidamente respeitadas, sob pena de se poderem reflaectir na legalidade da operação. Em princípio, os vícios de procedimento só são juridicamente irrelevantes quando, no caso concreto, se constata que não poderia ter sido tomada outra decisão ou quando se trate de pormenores insignificantes.[9]

Mais além, o âmbito de proteção da inadmissibilidade de provas ilícitas está em nítida conexão com a garantia da inviolabilidade do domicílio (art. 5º, XI, CF 1988) e possui esteio no princípio do devido processo legal (CF 1988, art. 5º., inciso LV).  A obtenção de quaisquer provas em desrespeito destas garantias e com infringência à vedação do anonimato deve ser eivada de nulidade, conforme defendido pela doutrina de MENDES[10].

Urge-se explicar que a nulidade das provas derivadas, baseada na doutrina norte-americana (“fruitsofthepoisonoustree”), é atualmente defendida pela jurisprudência maciça do Supremo Tribunal Federal, bem como na doutrina de OLIVEIRA[11], significando que, em virtude da conexão lógica entre a prova ilícita inicial (apreensões realizadas em desrespeito às garantias da inviolabilidade de domicílio, devido processo legal e da vedação ao anonimato) e todas as demais provas carreadas aos autos. Opróprio Código de Processo Penal (art. 157) estabelece o dever de desentranhamento tanto das provas diretamente obtidas da medida de busca e apreensão (dinheiro, droga e perícias), quanto dos elementos informativos dela indiretamente resultantes (depoimentos dos policiais militares e demais testemunhas da apreensão e prisão em flagrante).

No entanto, é necessário ressalvar que poderiam ser cogitadas possibilidades de convalidação das provas colidas, que segundo a doutrina de MENDES[12], somente se admitiriam caso se revelassem uma das possibilidades: (a) existência de provas autônomas (independente source), (b) descobertas inevitáveis (inevitablediscovery); e (c) provas ilícitas em prol da defesa.

Para que se constatasse uma “fonte independente” de prova, claro é que deveria existir um procedimento investigatório devidamente instaurado e tais elementos já perfectibilizados por meios formais (testemunhas, documentos, etc.). De outra banda, para uma descoberta inevitável, conforme o exemplo de MENDES[13], deveria já haver outra investigação em andamento, como por exemplo, um procedimento de escutas telefônicas autorizadas, que por via de conexão lógica, informassem previamente aos policiais da existência de drogas ilícitas dentro do asilo inviolável do investigado. No Código de Processo Penal[14]:

Art. 157.São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)

§ 1o São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)

§ 2o Considera-se fonte independente aquela que por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)

§ 3oPreclusa a decisão de desentranhamento da prova declarada inadmissível, esta será inutilizada por decisão judicial, facultado às partes acompanhar o incidente.  (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)

Retornando para o texto constitucional, ainda restaria se ponderar a respeito do cumprimento das buscas domiciliares,sob autorização do próprio investigado. Por certo que, mesmo que se revelasse uma autorização judicial inválida, no fato em tela não se obstaria que o próprio investigado permitisse aos policiais militares que adentrassem no interior de seu lar. Entretanto, nada constou nos autos, bem como não foi mencionado na ementa do acórdão, de forma que se perfectibilizasse a devida anuência prévia do morador para o cumprimento das diligências policiais.

Da mesma forma, os mesmos policiais militares não encontrariam a droga ilícita apreendida de forma outra senão invadindo o domicílio do réu. Justamente por se tratar de polícia ostensiva, não havia qualquer procedimento instrutório, ou seja, outras provas do delito de tráfico de drogas que viessem a sustentar os elementos de prova restantes.

Assim, tendo-se em conta que a instrução processual atacada se baseou em expediente que desrespeitou direitos fundamentais e garantias processuais constitucionais, a nulidade de todo o processo seria a decisão mais correta. A prova prospectada pela acusação foi obviamente oriunda da busca domiciliar ilegalmente decretada (sem fundamentação probatória), o que acarretou a contaminação de toda a instrução probatória, pois, segundo o Superior Tribunal de Justiça[15]:

Se todas as provas que embasaram a denúncia derivaram da documentação apreendida em diligência considerada ilegal, é de se reconhecer a imprestabilidade também destas, de acordo com a teoria dos frutos da árvore envenenada, trancando-se a ação penal assim instaurada..

4. Do Devido Processo e da Legitimidade Constitucional para Investigar


No momento em que passamos averiguar a legitimidade dos atos de investigação que embasaram a decisão judicial a quo, passamos a também vislumbrar mais uma querela de fundo constitucional. Conforme informado no corpo da ementa em foco, a operação policial foi diligenciada pela Polícia Militar. Os milicianos, por via de ordem expressa de seu comandante regional, efetuaram as buscas domiciliares em cumprimento de ordem judicial exarada pelo juízo da comarca de Ijuí – RS.

Consoante observado no voto do douto relator, nos autos do processo foi sedimentado que o Comandante do 29º BPM teria oficiado ao representante do parquet da mesma comarca, cientificando-o do recebimento de “denúncia anônima”. O referido informe teria inclusive sido recebido pela Brigada Militar por via telefônica, nada mais sido averiguado ou carreado aos autos, sendo então a única base do requerimento ministerial.

Forte em tais informações, recebido o requerimento ministerial de diligências pelo juízo a quo, houve o deferimento da medida excepcional de buscas domiciliares. Porém, em que pese o formalismo processual, tanto a origem da solicitação (denúncia anônima), quanto à fonte probatória (policiais militares) foram determinantes para que o Tribunal de Justiça vislumbrasse franca ilegalidade.

Conforme o eminente Relator, as Polícias Militares não teriam legitimidade para oficiar ao juízo do feito, bem como sua missão constitucional não abarcaria a investigação de infrações penais comuns, cuja titularidade seria das Polícias Civis. Segundo entendimento da Corte, o art. 144, e seus parágrafos, da CF 1988 estabelece a legitimidade da polícia judiciária para produção de provas em sede de processo penal.

Vejamos novamente passagem do voto do Eminente Relator:

O objeto da controvérsia, portanto, está na definição dos limites das atribuições da polícia militar. Entendendo-se estar ela autorizada a cumprir um mandado de busca e apreensão deferido pela autoridade judicial, sponte suam, a prova daí decorrente deveria ser considerada lícita; contrariamente, entendendo-se que a polícia militar não detém a função constitucional atribuída à polícia civil, ou podendo apenas executar a ordem sob direção de órgãos com atribuição investigativa, a prova daí resultante, deveria ser considerada ilícita.

Não extraio do texto constitucional e nem das leis ordinárias ter a polícia militar atribuição similar a da polícia civil. O art. 144, § 4º, da Constituição Federal, dispõe incumbir à polícia civil “as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.” Já o § 5º do mesmo artigo constitucional dispõe ser atribuição da polícia militar “a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública.” Se, por um lado, não há uma vedação expressa, por outro, é preciso reconhecer, ter o legislador constituinte estabelecido, expressamente, atribuições distintas, o que permite concluir não poder a polícia militar exercer atribuição da polícia civil ou do Ministério Público. Este, com poderes investigatórios, para os que admitem tal atribuição, de forma excepcional e subsidiária.

A afirmação quanto às missões constitucionais das polícias civis e militares, remonta a análise do art. 144 e seus parágrafos, da CF 1988, especificamente quanto à vontade do Constituinte. Temos que, no texto constitucional, face ao surgimento do novo Estado brasileiro de 1988, houve uma manifestação expressa do Poder Constituinte originário. Segundo BRANCO[16], instaurou-se um novo regime político com uma nova ideia de Direito e um novo fundamento de validade da ordem jurídica. Dessa maneira, qualquer conflito de leis ou desrespeito material às determinações da Constituição será fadado à declaração de nulidade absoluta.

Nesta questão, perfeito foi o argumento afirmado pelo eminente relator, salientando em seu voto que, admitida a possibilidade de a polícia militar praticar atos de investigação, acabar-se-ia admitindo a mesma prática por qualquer outra autoridade, em “verdadeira distribuição de mandados judiciais”, desestruturando-se a organização do Estado Constitucional.

Segundo o voto, demonstrou-se mais uma ilegalidade na decisão a quo, basicamente no deferimento de uma ordem de busca domiciliar para que o efetivo cumprimento da mesma, consistindo em uma diligência investigatória, fosse realizado pela polícia militar. Conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal[17], não há qualquer possibilidade de um policial militar vir a exercer funções próprias de polícia judiciária, como no debate ora realizado, no qual militares estavam notadamente desenvolvendo investigação de delito de tráfico de drogas ilícitas (art. 33, lei federal 11343/2006).

Na maneira como se instruiu o processo em xeque, claro restou que o princípio do devido processo penal também restou ferido de morte.Segundo a Constituição[18], art. 5º, inciso LV, “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”; ou seja, o indivíduo investigado foi privado de sua liberdade (preso), por meio de expediente que feriu expressamente o texto constitucional (art. 144, §4º, CF 1988), bem como previsão legal dos artigos 4º, 6º, 13 e 240, todos do Código de Processo Penal[19].

Por força do mesmo princípio-vetor da persecução criminal, segundo BONATO[20], o acusado teria direito ao processo justo, como forma de acesso à justiça. Através do respeito aos princípios que o norteiam é que se poderia dizer que o julgamento estaria livre de cometer injustiças, posto que observados direitos fundamentais do cidadão. Uma acusação regular, baseada em elementos colhidos de forma imparcial e verdadeira, seria a única forma de garantir a ampla defesa, com pleno acesso a todas as provas quesejam necessárias para provar a sua inocência. Outro não é o entendimento de THEODORO JR[21]:

Da constitucionalização do processo decorre um processo justo que absorve, naturalmente, aqueles direitos fundamentais específicos do processo, como a garantia do juiz natural e a proibição do juízo de exceção (CF, art. 5º, XXXVII e LIII), do contraditório e ampla defesa (art. 5º, LV), da inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos (art. 5º, LVI) e da motivação obrigatória das decisões judiciais (art. 94, IX).

Avançando-se no tema, temos que, restando sabida a ilegitimidade dos atores na coleta de provas para a instrução ora atacada pelo remédio constitucional, toda a instrução processual restou comprometida. Mesmo que o desrespeito à Constituição tenha se dado ao nível pré-processual, o Superior Tribunal de Justiça[22] tem asseverado que tais nulidades contaminam a toda a prospecção probatória, eis que a Constituição estabeleceu órgãos específicos para a investigação dos delitos comuns. Por direito, cabe ao juízo anular ao processo eivado de invalidades, pois não se há de admitir que a busca da verdade real venha a ser realizada com desrespeito à Constituição, às regras procedimentais e à legalidade estrita.

Neste passo, o combate a ações atabalhoadas e desrespeitadoras à legalidade, pela via judicial, é devidamente escudado pela moderna doutrina em Segurança Pública. Diz-se que o estudo da segurança deve evoluir de forma a sempre partir da esfera dos direitos fundamentais dos cidadãos brasileiros, lembrando que o Brasil é signatário do Pacto de San José de Costa Rica (Convenção Americana de Direitos Humanos), cujo art. 7º revê que toda pessoa tem direito à liberdade e segurança pessoais. Ou seja, segundo AZEVEDO e BASSO[23], o direito à segurança seria considerado direito fundamental de segunda geração, devendo o Estado promovê-lo de forma a reavaliar posições, anteriormente tomadas por administrações que ainda deixavam se influenciar pela herança ditatorial brasileira. Protesta-se pela formação de novos profissionais e de novas abordagens do tema segurança, com fulcro no Estado Democrático de Direito e na Constituição Republicana, com funções determinadas para cada um de seus operadores.

Assim, na previsão constitucional restam claros os papéis a seremdesempenhados por ambas as polícias, como forma de respeito à estrita legalidade e ao devido processo penal[24], bem como promoção da dignidade da pessoa humana, do direito fundamental à liberdade e à segurança. Vale lembrar que, pela visão sociológica[25], o direito não é mais entendido apenas como a forma de estabelecer limites ao poder administrativo, mas como um modo decisivo para a legitimidade no exercício desse mesmo poder. Em outras palavras, o texto constitucional enunciado no art. 144 e nos seus parágrafos foi oriundo de uma escolha do Poder Constituinte originário, composto por legisladores democraticamente eleitos para tal missão, o que trouxe total legitimidade ao regramento a ser obedecido pelo Estado-administração na garantia da ordem pública.



Conclusão


Após a breve exposição, em análise pormenorizada do acórdão do nosso Egrégio Tribunal de Justiça Gaúcho, temos que aferir que, a instituição Polícia, seja ela militar ou civil, basicamente representa a Administração Pública frente aos seus cidadãos. Por tal razão, toda e qualquer ação policial deve ser estritamente condizente com termos da legalidade, expressa por via de princípio-garantia na Constituição Federal de 1988.

A partir do momento que tal órgão da administração extrapola os exatos limites da norma legal, ou seja, atua além do que foi efetivamente expresso, como nocaso em tela, a Polícia Militar efetuando diligências investigatórias, há um caso de infração a mandamentos constitucionais e infraconstitucionais. Como se não fosse o bastante, a invasão da privacidade e do domicílio do investigado, por meio de uma ordem judicial não fundamentada e baseada tão-somente em tal atividade de investigação ilegal, também acaba por ser fato dependente de anulação pelo Poder Judiciário, em respeito à chamada justicialidade dos direitos fundamentais[26].

Sabendo-se que a Administração, como regra geral, deve nortear suas decisões e atividades concretas pela garantia e respeito aos direitos fundamentais de seus concidadãos; ao Poder Judiciário[27] cabe a missão de controlar os arbítrios e excessos praticados pelos administradores, que neste caso podem ser identificados nas pessoas do Comandante do 29ºBPM, do representante do parquet que opinou positivamente pela concessão de uma ordem manifestamente ilegal e o juízo a quo, pois este último tentou legitimar uma atividade de investigação praticada pela polícia ostensiva (em infração direta da Constituição Republicana, art. 144, §4º, bem como do Código de Processo Penal e da lei federal 12.830/2013, arts. 1ª a 3º).

Dessa forma, o acórdão ora analisado veio por garantir ao cidadão investigado, a anulação de um procedimento que lhe foi vexatório e causador de danos à sua esfera privada, passíveis de futura quantificação em meio ao juízo cível. A decisão do Egrégio Tribunal veio por garantir o respeito à Constituição Republicana e, por via do julgamento do remédio enérgico do habeas corpus, fez valer a legalidade estrita e o respeito às garantias do asilo inviolável e da privacidade, bem como da imprestabilidade das provas obtidas ilicitamente pela Brigada Militar.



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Notas


[1]MENDES, Gilmar F.; COELHO, Inocêncio M.; BRANCO, Paulo Gustavo G. Curso de Direito Constitucional. 4ª Edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2009, p.430.

[2]COSTA, Priscila.Fora da lei: denúncia anônima não pode fundamentar processo, diz AGU. São Paulo: [2007]. Disponível em: < http://www.conjur.com.br/2007-nov-28/denuncia_anonima_nao_fundamentar_processo_agu#autores>. Acesso em: 13jun. 2013.

[3]STJ - O Tribunal da Cidadania. Denúncia anônima não pode servir de base exclusiva para ação penal. Brasília: [2010]. Disponível em: < http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=100004#>. Acesso em 13 jun. 2013.

[4] BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Habeas Corpus Nº 70047333448, 3ªCâmara Criminal. Porto Alegre, RS, 15 de março de 2012.

[5]BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas corpus nº 108147 da 2ª. Turma. Brasília, DF, 11 de dezembro de 2012. Diário da Justiça Eletrônico – Dje-022, Brasília, DF, 01 fev. 2013.

[6]BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus n.º 149.250-SP da 2ª Turma. Brasília, DF, 07 de junho de 2011.

[7] FELDENS, Luciano; SCHMIDT, Andrei. Investigação Criminal e Ação Penal. 2ª. Edição. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado: 2007, p.28.

[8] BRASIL Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º105484, 2ª Turma. Brasília, DF, 12 de março de 2013. Diário da Justiça Eletrônico, Brasília, DF, 13 abril 2013.

[9]SOUZA, Antônio Francisco. A Polícia no Estado de Direito. São Paulo: Editora Saraiva, 2009, p.237.

[10] Ibid., p. 687.

[11] OLIVEIRA, Eugênio P. Curso de Processo Penal. 6ª. Edição. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2006, p. 643.

[12]MENDES, Gilmar F.; COELHO, Inocêncio M.; BRANCO, Paulo Gustavo G. Curso de Direito Constitucional. 4ª Edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2009, p.689.

[13] Ibid., p. 704.

[14]BRASIL. Dec.-Lei nº 3689, de 03 de outubro de 1941.Código de Processo Penal. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 13 out. 1941 Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm#art810>. Acesso em: 13 jun. 2013.

[15] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas corpus nº 100.879 – RJ. 6ª Turma. Brasília, DF, julgado em 19 de agosto de 2008.  Disponível em: < https://ww2.stj.jus.br/revistaeletronica/Abre_Documento.asp?sLink=ATC&sSeq=4200814&sReg=200800428752&sData=20080908&sTipo=5&formato=HTML>. Acesso em: 14 jun. 2013.

[16]MENDES, Gilmar F.; COELHO, Inocêncio M.; BRANCO, Paulo Gustavo G. Curso de Direito Constitucional. 4ª Edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2009, p. 234.

[17] BRASIL. Supremo Tribunal Federal.  Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 3441, Tribunal Pleno, Brasília, DF,julgado em 05 de outubro de 2006.  Brasília, DF, Diário da Justiça, Vol. 2267-01, pp132, LESTF v. 29, p. 100-105.

[18] Ibid.

[19] Ibid.

[20] BONATO, Gilson. Por um efetivo "devido processo penal". Scientiaiures. Vol. 1. Londrina, PR, 2012, pp29-42

[21]THEODORO JR., Humberto.Constituição e processo: desafios constitucionais da reforma do processo civil no Brasil. Estudos Legislativos. Vol. III - Constituição de 1988 : O Brasil 20 anos depois. Disponível em: < http://www12.senado.gov.br/publicacoes/estudos-legislativos/resultadopesquisa>. Acesso em: 15 jun. 2013.

[22]BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus nº. 149250-SP. Brasília, DF,julgado em 07 de junho de 2011. Brasília, DF, Diário da Justiça Eletrônico, 05 set. 2011.

23]Conforme a doutrina: “A dificuldade diz respeito à segurança pública. Questiona-se se aquilo que se concebe como segurança pública enquadra-se como direito fundamental e, se positiva a resposta, em qual de suas dimensões. Perquire-se se a hipótese seria de uma espécie de direito coletivo. Na verdade, quando se fala em segurança pública e por ela se clama, se está a falar em política de segurança pública, ou seja, de uma ação por parte do Estado que garanta segurança pessoal do indivíduo e que possa frear a violência desmesurada. (...) Por tudo o que foi visto, tem-se que o direito fundamental à segurança pessoal faz parte da primeira dimensão dos direitos fundamentais, vinculado que está à integridade física, à liberdade pessoal, etc. A segurança pública, por sua vez, pode ser concebida como a dimensão pública da segurança pessoal e, assim como a habitação, saúde, etc., necessita de um agir Estatal, estando situada, por isso, na segunda dimensão dos direitos fundamentais. Por duas vias, o direito à segurança encontraria guarida como direito fundamental, por estar no corpo da Constituição, pois previsto em seu art. 144, e por constar, sob outra dimensão,como segurança pessoal, no art. 7º da Convenção Americana de Direitos Humanos.” (AZEVEDO, Rodrigo G.; BASSO, Maura. Segurança Pública e Direitos Fundamentais. Direito & Justiça, Porto Alegre, v. 34, n. 2, p. 21-32, jul./dez. 2008.)

[24] Segundo a doutrina: “Não se estrutura um processo penal justo, tendo como alicerce a violação da dignidade humana. E, de outra sorte, a garantia constitucional do devido processo penal tornar-se-ia letra morta na Lei Maior. Atente-se, ainda, que a violação das aludidas garantias constitucionais, na realização de busca e apreensão, atinge, de modo direto, o devido processo penal (art. 5º, inc. LIV, da Cosntituição da República). Além disso, é, expressamente, vedado na Lei Maior, a admissibilidade, no processo, das “provas obtidas por meios ilícitos” (art. 5º, inc. LVI, da Constituição da República).” (PITOMBO, Cleunice. Da busca e apreensão no processo penal. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1996, p. 65).

[25] BEGALLI, Ana S.; SILVESTRE, Marco A.; SANTOS, Maria R.; SIMIONI, Rafael; SILVA, Régis W. ROMEIRO, Vitor R.A legitimidade do poder administrativo: o Estado Democrático de Direito em Jürgen Habermas. Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, v. 79, n. 2, p. 48-61, Abril 2011.

[26] FELDENS, Luciano. Direitos Fundamentais e Direito Penal – A Constituição Penal. 2ª. Edição. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, 2012, p.39-41.

[27]Segundo a doutrina: “No que diz com relação entre órgãos da Administração e os direitos fundamentais, no qual vigora o princípio da constitucionalidade imediata da administração, a vinculação aos direitos fundamentais significa que os órgãos administrativos devem executar apenas as leis que àqueles sejam conformes, bem como executar estas leis de forma constitucional, isto é, aplicando-as e interpretando-as em conformidade com os direitos fundamentais. A não-observância destes postulados poderá, por outro lado, levar à invalidação judicial dos atos administrativos contrários aos direitos fundamentais, problema que diz com o controle jurisdicional dos atos administrativo,...” (SARLET, Ingo. A eficácia dos Direitos Fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 10ª edição. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado: 2010, p.370)

Autor


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Ayrton Martins Júnior

Delegado de Polícia, PCRS, mestrando em Ciências Criminais, PUCRS, graduado em Direito pela UFSM.

Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT):

MARTINS JÚNIOR, Ayrton. Ilegalidade de investigação de crimes comuns pela Polícia Militar - estudo de caso. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3762, 19 out. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/25544>. Acesso em: 22 out. 2013.



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