O representante da ADEPOL, João Moraes, começou o debate questionando a inconstitucionalidade do projeto, uma vez que a Constituição é clara ao delimitar que a competência para investigar é exclusiva das policias judiciárias. Qualquer mudança neste sentido só poderá ser feita por meio de Projeto de Emenda Constitucional e não de um projeto de lei, como está proposto. Moraes também falou sobre a necessidade de ampliar o debate, entregando ao presidente da Comissão, deputado Otávio Leite, uma lista de sugestões de relevantes figuras do mundo jurídico. “Se vamos discutir uma mudança constitucional isso não pode ficar restrito a duas categorias, temos que ouvir todos que labutam no mundo jurídico. Este é o viés democrático”, afirmou Moraes.
Sobre o poder de investigação do MP, João Moraes esclareceu que isso já é possível e previsto, desde que seja feita por meio de requisição de instauração de inquérito à Polícia, e não diretamente, o que é inconstitucional e ilegal. “Hoje o MP é proibido de investigar e se o faz é em flagrante desrespeito à lei, é usurpação de função, é crime. Qualquer investigação pelo MP é ilícita e pode ser questionada pelos investigados e considerada nula”, reforçou o delegado. “Prova disso é que inúmeras investigações estão sendo questionadas hoje no judiciário”, lembrou.
Falta de controle - Outro critica ao projeto que dá poder de investigação ao Ministério Público é a completa falta de controle do órgão. “Quem controla os atos do MP durante a investigação criminal?”, questionou o representante da Associação de Delegados da Polícia Federal, Rodrigo de Melo Teixeira. Segundo Rodrigo, o projeto da deputada Marina Santanna (PT-GO), como está, aumenta descontroladamente o poder do Ministério Público.
Para a ADPF o projeto transforma o procurador-geral da República no homem mais poderoso do País, já que cabe a ele a decisão final sobre apresentar ou arquivar denúncias contra as mais altas autoridades do País. No entanto, ele mesmo não pode ser denunciado, uma vez que qualquer investigação que envolva membros do MP deve ser encaminhada ao próprio MP. "Quem tem uma função pública relevantíssima de oferecer a denúncia, assim como quem tem a função pública relevantíssima de investigar, tem que ter formas de controle externo. Este projeto de lei, ao contrário, consolida a total ausência de controle no Ministério Público", assinalou Teixeira.
Representante da OAB e da Universidade de Brasília também questionam projeto e falta de controle do MP
O conselheiro da OAB Evandro Pertence acredita que a proposta dá amplos poderes ao MP e não estabelece obrigações. Ele criticou também a previsão de que o inquérito penal tramite inteiramente no âmbito do MP. “Não tem como não enxergar neste projeto todas as tintas da caneta do Ministério Público. O projeto como está deixa nas mãos do MP todo o andamento do inquérito”, criticou Pertence.
Ele lembrou ainda que a proposta prevê que o MP pode fazer escutas ou quebra de sigilos sem autorização judicial, apesar da previsão constitucional dessa exigência. Pertence afirmou que isso pode gerar muito estardalhaço, mas vai gerar processos nulos. "Aqueles que cometem crimes não serão condenados porque o processo será nulo".
Em meio às críticas, o representante da OAB, enumerou também pontos que considera positivos na proposta, como a garantia da preservação de provas e indícios que possam inocentar o réu; a proibição de que o investigado seja apresentado publicamente sem consentimento defensor e a previsão que o investigado tenha acesso aos autos assim que tomar conhecimento da investigação e que possa requerer diligências. Por outro lado, Pertence questionou a falta de recurso possível no caso de negativa.
A professora e pesquisadora de ciências policiais, Cristina Maria Zackeski, representante da Faculdade de Direito da UnB, também questionou a incongruência entre o tom da justificativa do projeto e o texto final apresentado: “O que fica claro neste projeto é que o Ministério Público fica om o “filé”, com a parte mais importante da investigação”, avaliou a pesquisadora. “E isso sem nenhum controle, como tem a atividade policial”, lembra.
Na avaliação da pesquisadora, o projeto diminui a importância da participação da polícia, colocando o MP como ponte entre a Polícia e o Judiciário. “Desta forma, como as pessoas podem pressupor que a Polícia poderia ser mais corrupta que Ministério Público (se ela tem o controle do próprio MP, enquanto este não tem nenhum controle). Não vejo lógica nisso”, destacou.
O presidente do Sindicato dos Delegados do Pará, João Moraes, também rebateu criticas neste sentido: “Onde está escrito que o delegado não tem independência para investigar? Ele tem, sim! O que pode acontecer é o agente temer a força ou o poder político de alguém, mas isso é só uma questão de perder o medo de ter medo”, afirmou.
Quem investiga os casos que envolvem a parcela menos favorecida população - João Moraes questionou ainda a confissão de ilegalidade feita promotores durante reuniões da Comissão Especial para discutir a PEC 37, ao firmarem que querem, sim, fazer investigações seletivas, ou seja, investigar só o que querem - o que não foi contestado pelos representantes do MP presentes. “A preocupação do MP é apenas com o que dá mídia, não tem preocupação em investigar o que interessa aos mais humildes, como o roubo do botijão de gás da dona Maria ou a bicicleta do seu Zé, que, se não é pelo delegado de polícia, ficam desvalidos”.
Outros pontos ainda foram levantados pelo representante da ADEPOL em relação às investigações feitas pelo MP, como investigação sem boletim de ocorrência, ou seja, sem formalidade, caracterizando um incentivo a corrupção e um desrespeito à ampla defesa; se o MP puder investigar, teremos a necessidade de abrir a possibilidade do advogado do acusado (a defesa) também investigar, para garantir o equilíbrio do sistema; e a legitimação das investigações ilegais já realizadas sem o devido amparo legal.
Representantes do MP reconhecem necessidade de regulamentação da investigação por parte do órgão
O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, Alexandre Camanho de Assis, que também participou da audiência publico para debater o projeto que trata da investigação criminal, afirmou que as discussões, ocorridas até então, serviram para mostrar a necessidade de regulamentação do poder de investigação pelo MP para que a questão fique superada. Para Lacerda, a discussão também permitiu que os próprios promotores aceitassem algumas das limitações propostas.
O representante da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), Alexandre Magno Benites de Lacerda, também fez a mesma avaliação. “O debate que começou com a PEC 37 trouxe como ganho a reflexão por parte do Ministério Público de onde ele precisa melhorar”, afirmou. Alexandre também destacou que o projeto ajudará a acabar com a espetacularização e o pré-julgamento que o investigado sofre, antes mesmo de haver qualquer prova contrária a ele, como ocorre hoje.
Em Anexo, Íntegra da proposta: PL-5776/2013
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