Marconi Perillo
Um pacto pela segurança
A União deveria custear até 50% da folha de pagamento das
polícias Militar, Civil e Técnico-Científica e do Corpo de Bombeiros Militar
As guerras travadas no Congresso Nacional em torno da divisão dos royalties
do petróleo e da reforma do ICMS trouxeram à luz um debate que não pode mais ser
adiado: a revisão do pacto federativo.
Os Estados encontram-se espremidos financeiramente, tanto pelas exigências da
Lei de Responsabilidade Fiscal quanto pela queda de repasses da União na esteira
das sucessivas desonerações do governo. Precisam, não obstante, ampliar
investimentos em serviços públicos.
A segurança pública é um setor que demanda solução urgente, vitimado de forma
particularmente grave pela situação fiscal dos Estados. Segundo dados do Mapa da
Violência 2013, a taxa de homicídios na população brasileira, que em 1996 era de
24,8 por 100 mil habitantes, saltou para 27,1 em 2011. É o maior índice entre os
12 países mais populosos do mundo --quase quatro vezes maior que o do Paquistão.
Para fazer frente à demanda cada vez maior por segurança pública, é
necessário aumentar o efetivo das polícias. Mesmo em meu Estado, onde o salário
inicial de um policial militar é o segundo mais alto do Brasil e onde
conseguimos, em 2013, produzir uma inflexão na taxa de homicídios, o número de
policiais por habitante é baixo: o efetivo é de apenas 12 mil homens, metade do
necessário para atingir o patamar de 1 policial por 250 habitantes recomendado
pela ONU.
Não existe mágica contábil que nos permita fazer um aporte de pessoal dessa
magnitude. As transferências federais caíram nos últimos dois anos, em parte
devido às desonerações de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) e Cide
(Contribuição sobre Intervenção no Domínio Econômico) feitas pelo governo para
estimular a economia. Essa caridade foi feita com o chapéu dos Estados, que
viram despencar o montante do FPE (Fundo de Participação dos Estados).
Por outro lado, o piso da educação subiu 22% em 2012 e mais 8% em 2013, o que
fez com que mesmo o aumento de 6,7% na arrecadação de Goiás não desse conta de
cobrir as despesas com a folha de pessoal.
Para mitigar a situação da segurança pública e desafogar os Estados, o
governo de Goiás propõe uma revisão do pacto federativo. Nossa proposta consiste
em uma emenda ao artigo 21 da Constituição, por meio da qual a União deverá
prestar assistência financeira aos Estados para a manutenção e a execução de
serviços de segurança pública.
Antes que o leitor se espante com a ousadia ou questione se isso não trará
problemas na cadeia de comando --já que a PM deve obediência ao governador, que
paga seu soldo--, permita-me lembrar que já existe um precedente. A Polícia
Militar e o Corpo de Bombeiros do Distrito Federal são mantidos pelo governo
federal, sem que cause constrangimento à autoridade do governador.
O Fundo Constitucional para a Segurança Pública, que seria instituído por lei
ordinária para regulamentar o dispositivo constitucional, seria usado para
custear até 50% da folha de pagamento da PM, da Polícia Civil, do Corpo de
Bombeiros Militar e da Polícia Técnico-Científica.
Propomos que ele seja repartido aos Estados conforme o número de agentes de
segurança pública por habitante: quanto mais policiais, mais verba o Estado
receberia. O fundo seria corrigido pela receita líquida corrente da União.
O projeto tem a vantagem adicional de pôr fim à polêmica em torno da PEC 300,
em tramitação no Congresso, que equipara os salários da PM e dos bombeiros de
todo o país aos do DF e ao qual os governadores resistem, não sem razão.
Não estar-se-ia, com isso, produzindo nenhuma revolução no ordenamento
jurídico brasileiro, dado o precedente do Distrito Federal.
Trata-se tão somente de propor um pacto --palavra tão em voga em Brasília--
por mais um serviço público essencial, que tem ficado de fora do radar do
governo federal, gerando risco desnecessário e evitável para toda a população.
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