Lei
12.878/2013: Prisão cautelar de extraditando
prisão preventiva de
extraditando se caracteriza como uma nova espécie de prisão cautelar, com
características próprias e restritas a esta modalidade
Foi publicada no dia 04 de novembro de2013 a Lei n°12.878/2013,
que traz em seu conteúdo, entre outras coisas, uma inovação no procedimento de
prisão cautelar de extraditando.
Foi publicada no dia 04 de novembro de
Primeiramente, devemos
destacar que, nos termos do artigo 5°, inciso LXI, da Constituição da
República, à exceção dos casos de flagrante delito, transgressões militares e
crimes propriamente militares definidos em lei, a privação da liberdade de
locomoção de uma pessoa só poderá ocorrer mediante ordem escrita e fundamentada
da autoridade judiciária competente. Conforme se depreende de uma análise
perfunctória do dispositivo, trata-se de um direito fundamental que limita a
atuação do Estado em benefício do direito de liberdade do indivíduo (direito de
defesa).
Justamente por se tratar
de um direito fundamental tão importante, a privação da liberdade de locomoção
sem a manifestação do Poder Judiciário deve ser excepcional e a prisão em
flagrante é o exemplo que melhor ilustra essa situação, sendo tal exceção
justificada devido à importância desta medida pré-cautelar, que tem a função de
proteger os direitos fundamentais (contidos nos tipos penais incriminadores)
que estão sendo atacados ou acabaram de ser. Tendo em vista a excepcionalidade
desta modalidade prisional, o Delegado de Polícia, autoridade responsável pela
sua formalização, deve lavrar um minucioso e burocrático auto de prisão em
flagrante, sempre com o objetivo de fundamentar esta restrição.
Nesse sentido, à exceção
das hipóteses expressamente previstas na Constituição da República, a privação
da liberdade de locomoção sempre dependerá de ordem fundamentada da autoridade
judiciária competente. Em decorrência dessa determinação, afirmava-se que o
artigo 81 do Estatuto do Estrangeiro não havia sido recepcionado pela
Constituição de 1988, uma vez que o seu conteúdo permitia que o próprio
Ministro da Justiça decretasse a prisão preventiva de extraditando.
Assim, mesmo antes da
inovação legislativa promovida pela Lei 12.878/13, o Supremo Tribunal Federal
já havia se manifestado no sentido de que a prisão preventiva de extraditando
só poderia ser decretada pelo Ministro Relator da Suprema Corte, haja vista ser
este o órgão jurisdicional com competência para processar e julgar a extradição
solicitada por Estado estrangeiro (art.102, inciso I, “g”, da Constituição da
República).[1]
Ocorre que com a nova
lei foi colocada uma pá de cal no assunto, sendo que a partir de agora a
decretação da prisão cautelar do extraditando deverá seguir a previsão
constante no artigo 82 do Estatuto do Estrangeiro, já com a redação estipulada
pela Lei 12.878/13. Vejamos o conteúdo do dispositivo:
Art. 82. O Estado
interessado na extradição poderá, em caso de urgência e antes da formalização
do pedido de extradição, ou conjuntamente com este, requerer a prisão cautelar
do extraditando por via diplomática ou, quando previsto em tratado, ao
Ministério da Justiça, que, após exame da presença dos pressupostos formais de
admissibilidade exigidos nesta Lei ou em tratado, representará ao Supremo
Tribunal Federal.
§ 1o O pedido de prisão
cautelar noticiará o crime cometido e deverá ser fundamentado, podendo ser
apresentado por correio, fax, mensagem eletrônica ou qualquer outro meio que
assegure a comunicação por escrito.
§ 2o O pedido de prisão
cautelar poderá ser apresentado ao Ministério da Justiça por meio da
Organização Internacional de Polícia Criminal (Interpol), devidamente instruído
com a documentação comprobatória da existência de ordem de prisão proferida por
Estado estrangeiro.
§ 3o O Estado
estrangeiro deverá, no prazo de 90 (noventa) dias contado da data em que tiver
sido cientificado da prisão do extraditando, formalizar o pedido de extradição.
§ 4o Caso o
pedido não seja formalizado no prazo previsto no § 3o, o extraditando deverá
ser posto em liberdade, não se admitindo novo pedido de prisão cautelar pelo
mesmo fato sem que a extradição haja sido devidamente requerida.
Nos termos do artigo
supramencionado, percebe-se que, nos casos de urgência e mesmo antes da
formalização do pedido de extradição, o Estado interessado poderá requerer a
prisão cautelar do extraditando, seja pela via diplomática ou, quando previsto
em tratado, por meio do Ministério da Justiça. Neste caso, caberá ao Ministro
da Justiça, após analisar a presença dos pressupostos formais de
admissibilidade exigidos no Estatuto do Estrangeiro ou em tratado específico,
representar ao Supremo Tribunal Federal pela decretação da medida.
Salta aos olhos,
portanto, que a prisão preventiva de extraditando se caracteriza como uma nova
espécie de prisão cautelar, com características próprias e restritas a esta
modalidade prisional. Primeiramente, devemos nos atentar para o legitimado
ativo da medida, que, de acordo com o caput do artigo 82, é apenas o Ministro
da Justiça. Isso significa que a inovação legislativa acabou por conferir à
mencionada autoridade uma atribuição de representação exclusiva no que se
refere à prisão cautelar do extraditando.
Nos termos do
dispositivo em questão, o Estado interessado na prisão poderá apenas solicitar
a sua execução, devendo, para tanto, informar o crime cometido pelo
extraditando e os fundamentos que justificam a adoção dessa medida extrema. O
Ministro da Justiça, por sua vez, deverá analisar se estão presentes os
requisitos para a prisão e, de acordo com o seu livre convencimento motivado,
optar ou não pela representação.
Percebe-se que, dessa
forma, o Ministro da Justiça se transforma no verdadeiro titular da pretensão
cautelar de extradição, sendo que sua decisão não comportará qualquer recurso.
Em outras palavras, a decretação da prisão cautelar do extraditando dependerá
tanto do Ministro da Justiça, como da autoridade judicial competente, pois se
aquele optar pela não representação, não haverá nada que o Estado interessado
possa fazer para reverter tal situação.
Com todo respeito às
opiniões em sentido contrário, mas o ideal seria que a lei conferisse tão
importante mister ao Procurador Geral da República, que é o representante do
Ministério Público no Supremo Tribunal Federal e tem completa isenção para
analisar o caso despido de influências políticas, preservando-se, assim, os
aspectos jurídicos do caso e, especialmente, os interesses dos envolvidos
(Estado estrangeiro e extraditando). Inobstante a lei não faça menção,
entende-se, de qualquer modo, ser importante que, antes de proferir decisão, a
Autoridade Judicial ouça o Procurador Geral da República que deve atuar ao
menos como “custus legis”.
Dando continuidade, o
§1°, do artigo 82 determina que o pedido de prisão cautelar feito pelo Estado
interessado poderá ser apresentado pelo correio, fax, mensagem eletrônica ou
qualquer outro meio que assegure a comunicação por escrito, tudo com o objetivo
de dar uma maior celeridade ao procedimento. Da mesma forma, o pedido também
poderá ser feito pela Organização Internacional de Polícia Criminal (Interpol),
desde que, é claro, seja instruído com a documentação comprobatória da existência
de ordem de prisão proferida por Estado estrangeiro (art.82, §2°).
Em consonância com o
§3°, do artigo 82, o Estado estrangeiro terá o prazo de noventa dias, contados
da data em que houver sido cientificado do cumprimento do mandado de prisão
cautelar do extraditando, para formalizar o pedido de extradição, o que deverá
ser feito nos termos dos artigos 76 e seguintes do Estatuto do estrangeiro.
Caso o pedido não seja formalizado dentro de referido prazo, o extraditando
será posto em liberdade e não será admitido novo pedido de prisão cautelar pelo
mesmo fato sem que a extradição tenha sido devidamente requerida (art.82, §4°).
Em conclusão, tendo em
vista o caráter cautelar da prisão em análise, considerando que, na maioria dos
casos, essa medida tem por objetivo assegurar a aplicação da lei penal do
Estado estrangeiro interessado, entendemos que o Ministro do STF responsável
pela apreciação da “representação ministerial” deverá observar o disposto no
artigo 282, do Código de Processo Penal, que se caracteriza como uma cláusula
geral das medidas cautelares. Demais disso, caso opte pela não decretação dessa
medida extrema, a Autoridade Judicial poderá se valer das medidas cautelares
diversas da prisão, constantes no artigo 319, do mesmo Estatuto Processual.
Destaque-se, todavia, que, em se tratando de extraditando com sentença
condenatória com trânsito em julgado no exterior, o §6°, do artigo 282, CPP,
não terá aplicação. Em outras palavras, nessas circunstâncias a prisão cautelar
não precisa, necessariamente, ser adotada apenas em último caso, inclusive
porque já não paira sobre a cabeça do extraditando o princípio constitucional
da presunção de não-culpabilidade, prevalecendo, assim, os requisitos específicos
para a extradição.
Nota
[1] STF, Pleno, HC
n°73.256/SP, Rel. Min. Sydney Sanches, DJ 13.12.1996.
Autor
·
Francisco Sannini Neto
Delegado de Polícia do
Estado de São Paulo. Pós-Graduado com Especialização em Direito Público pela
Escola Paulista de Direito. Professor da Graduação e da Pós-Graduação do Centro
Universitário Salesiano de Lorena/SP.
Informações sobre o
texto
Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT):
NETO, Francisco Sannini. Lei
12.878/2013: Prisão cautelar de extraditando. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3787, 13 nov. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/25828>. Acesso em: 14 nov. 2013.
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