segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Velhas receitas para a contenção da violência


 

Autor: Carlos Alberto Marchi de Queiroz

 
Os meios de comunicação de massa estão repletos de apelos populares ao governo para que ponha fim à onda de violência que hoje ameaça as instituições.
 
O povo, levantando faixas e cartazes, pede paz. A culpa ora é jogada sobre a Polícia, braço armado do Poder Executivo, ora lançada sobre a Justiça, membro pacífico do Poder Judiciário, ora atirada sobre o Congresso, expressão, nem sempre legítima, do Poder Legislativo.
 
A Polícia, por delegação, e a Justiça, por competência, combatem os efeitos do crime. O Legislativo e o Executivo minimizam as causas, através de leis justas e de orçamentos bem administrados.
 
Não é de hoje que as melhores cabeças pensantes vêm tentando explicar as causas da violência urbana no mundo. Remetem, em vão, suas conclusões àqueles que, episodicamente, dirigem os destinos da sociedade, colocados no comando por meios democráticos ou até revolucionários. Suas considerações não se aplicam, unicamente, ao Brasil, mas a todos os países de cultura ocidental.
 
Numa época em que nem se falava em Criminologia, Platão, sagaz como poucos, escrevia em "A República" que "o ouro dos homens sempre foi o motivo de seus males”. Tentava demonstrar que os fatores desencadeadores do crime eram de ordem social e econômica. Dizia que onde havia pobres havia vilões.
 
Aristóteles, na "Política", observou que a miséria gerava a revolta e o crime. Esses ensinamentos foram absorvidos por São Tomás de Aquino. Na “Summa Theologica”, o santo defendia a tese do furto famélico, do furto para comer, hoje considerado estado necessário pelo direito penal brasileiro. Não obstante, sustentou que a pobreza era causa geradora dos crimes contra o patrimônio, principalmente furtos e roubos.
 
Essas observações levaram Thomas Moore, ou Thomas Morus, a usar, em seu livro "A Utopia", o personagem Rafael Hitlodeu, para falar verdades. Morus dizia que quando um povo é miserável a riqueza e a opulência ficam em poder das classes superiores, situação que gera maior número de crimes. Principalmente pelo comprometimento moral diretamente ligado ao luxo esbanjador dos ricos.
 
Erasmo de Roterdã seguiu os passos de Santo Agostinho e de Thomas Morus. Alertou que a pobreza era o grande filão (sic) da criminalidade. Martinho Lutero, Francis Bacon e René Descartes chegaram a idênticas conclusões. As causas socioeconômicas são geratrizes de criminalidade. Montesquieu, no "L\\\' Esprit des Lois", sustentou que o bom legislador é aquele que se empenha na prevenção do delito. Jean-Jacques Rousseau, no "Contrato Social", encampando essa ideia, registrou que "a miséria é a mãe dos grandes delitos".
 
Cesare Bonesana, o marquês de Beccaria, no antológico "Dos delitos e das penas ", de 1764, ressaltou que "o roubo é ocasionado geralmente pela miséria e pelo desespero". Desde então criminólogos se revezam tentando alertar políticos de plantão que a pobreza é fator de criminalidade. John Howard, Felipe Pinel, Darwin, Julian Huxley, Cesare Lombroso, Dionélio Machado, Manoel Pedro Pimentel doutrinaram em vão. Parodiando Erasmo de Roterdã ousamos escrever que a pobreza é a grande vilã da criminalidade.
 
A assinalação criminal, valendo-se da estatística, tornou evidente que ocorrem mais crimes nas periferias e menos em condomínios de luxo... A ausência do Estado-Administração contribui para o aumento da criminalidade. Na medida em que deixa de pagar salários de mercado aos servidores públicos de carreira, privilegiando os comissionados, de construir boas escolas, bons hospitais, bons pronto-socorros, boas delegacias, bons fóruns, boas áreas de lazer, esquecendo-se do povo carente da periferia, a tendência é vermos crescer as temidas cifras negras da criminalidade. Enrico Ferri doutrinava: "um poste de iluminação a mais, um crime a menos". A violência é, nuclearmente, uma questão municipal. Governadores e prefeitos precisam agir em conjunto. Tribunais noturnos, funcionando 24h, ininterruptamente, acoplados à Polícia na repressão e execução penal de crimes de pequeno e de médio potencial ofensivo, são poderosos dissuasores criminais.
 
Desde Platão, os criminólogos vêm pregando que a pobreza não é causa, mas fator de criminalidade. Se pobreza fosse causa, todos os pobres seriam criminosos. Políticos e seus assessores deveriam ler mais e agir ainda mais rapidamente. Só assim a violência diminuirá. Jamais desaparecerá, por completo. A violência é uma característica intrínseca do ser humano. Comparem o Haití com a Suiça. Depois, tirem suas próprias conclusões.
 
Carlos Alberto Marchi de Queiroz é professor da Academia de Polícia
 

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