sábado, 22 de dezembro de 2012

Álcool e trânsito: crime ou infração administrativa?

 




 
LUIZ FLÁVIO GOMES, 55, doutor em direito penal, fundou a rede de ensino LFG. Foi promotor de justiça (de 1980 a 1983), juiz (1983 a 1998) e advogado (1999 a 2001). Estou no professorlfg.com.br

Está em vigor a nova lei seca (Lei 12.760), que endurece o Código de Trânsito. A tragédia nacional das mortes está retratada nos nossos levantamentos do institutoavantebrasil.com.br. Dirigir sob o efeito do álcool ou outra substância psicoativa é crime ou infração administrativa? O crime está previsto no art. 306, enquanto esta última está contemplada no art. 165 do CTB. Qual a diferença entre eles?

Se o condutor dirige o veículo automotor “sob a influência do álcool ou outra substância” está cometendo a infração administrativa do art. 165. Se conduz o veículo automotor sob tal influência e com a “capacidade psicomotora alterada” ingressa no crime do art. 306. Essa foi a fórmula encontrada pelo legislador para diferenciar o crime da infração administrativa.
Nesta última a capacidade de dirigir com segurança se reduz, diminui, mas não desaparece. O agente está apenas “sob a influência” do álcool ou outra substância. O nível do risco (para a segurança viária e, em consequência, para a vida ou integridade física alheia) não é grande, a ponto de o sujeito não ter o controle do veículo.
As sanções cabíveis nesse caso, de acordo com a nova lei, são: 1) multa de R$ 1.915,40, 2) suspensão do direito de dirigir por 12 meses, 3) recolhimento da carteira de habilitação, 4) retenção do veículo e 5) sete pontos na carteira em razão da infração gravíssima.
Para a configuração do crime, punido com prisão de 6 meses a 3 anos, além das sanções administrativas, o nível de exigência é maior. É preciso que o condutor esteja com a “capacidade psicomotora alterada”, ou seja, ele não faz uma direção segura, colocando indeterminadamente em risco a vida ou integridade física alheia, isto é, rebaixando concretamente o nível da segurança viária. Não é preciso ter vítima concreta. Basta a comprovação de que o agente não estava em condições de dirigir com segurança (capacidade psicomotora alterada).
Exemplos de configuração do crime: o sujeito ingeriu álcool ou outra substância e dirigia de forma anormal (ziguezague, subiu calçada etc.); ou estava visivelmente, ostensivamente, notoriamente embriagado (não conseguindo sequer caminhar sozinho, por exemplo); o sujeito tinha 1,5g de álcool por litro de sangue ou mais (situação inequívoca de embriaguez, com patente redução da capacidade de dirigir com segurança). Nessas três situações a configuração do crime é inequívoca.
Situações que gerarão dúvida: (a) o condutor tem de 0,6 decigramas a 1,5g de álcool por litro de sangue. Tudo depende aqui do caso concreto, da pessoa concreta etc. Cada pessoa reage de uma forma frente ao álcool: pode ou não perder sua capacidade psicomotora; (b) caso de provas unicamente testemunhas, clínicas, vídeos, imagens, filmagens etc. Tudo depende de cada caso concreto.
Nas três primeiras situações o juiz agirá com segurança. Nas duas últimas depende da valoração do condutor e de todas as circunstâncias do caso. Muitas polêmicas acontecerão em torno da “capacidade psicomotora alterada”. É que muita gente bebe 2 copos de cerveja e não sente nenhum tipo de alteração. Outros (sensíveis), até com um copo já se encontram alterados.
Na dúvida, ou seja, quando o juiz não reúne prova suficiente e segura para condenar pelo delito, cabe-lhe absolver o réu, enviando cópia de tudo à autoridade de trânsito para o enquadramento do agente no art. 165 do CTB. Como se vê, quem ingere álcool ou outra substância e dirige, não vai escapar: ou está praticando crime ou uma infração administrativa (com duras sanções), salvo casos de tolerância, como a ingestão de um bombom com licor

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