Tráfico tomou lugar do roubo como crime mais
encarcerador do país
O tráfico nacional de entorpecentes passou a ocupar a posição de crime mais encarcerador do país, com 24% do total de prisões, enquanto que o roubo qualificado passou a constituir 17% delas.
O tráfico nacional de entorpecentes passou a ocupar a posição de crime mais encarcerador do país, com 24% do total de prisões, enquanto que o roubo qualificado passou a constituir 17% delas.
O roubo qualificado era o crime mais
encarcerador do país em 2005 (22% dos presos). De acordo com os levantamentos
do Instituto Avante Brasil, com base nos dados divulgados pelo DEPEN –
Departamento Penitenciário Nacional, o tráfico de entorpecentes ocupava o
segundo lugar, representando 13,4% das prisões. Em 2011 o cenário se inverteu.
O tráfico nacional de entorpecentes passou a ocupar a posição de crime mais
encarcerador do país, com 24% do total de prisões, enquanto que o roubo
qualificado passou a constituir 17% delas.
São muitas as razões que explicam o fenômeno.
Dentre elas cabe destacar as seguintes:
(a) em 2006 foi promulgada a nova Lei de
Drogas e isso, certamente, muito contribuiu para o crescimento de 282% no
número de presos por tráfico de entorpecentes (nacional e o internacional)
entre 2005 e 2011, enquanto o número de prisões por roubo (simples e
qualificado) cresceu 88%.
(b) o cenário acima retrata verdadeira mutação
e evolução da criminalidade. As razões para a migração do crime de roubo para o
de tráfico, é de se supor, relacionam-se com as vantagens econômicas advindas
deste crime. Dinâmico, de fácil manuseio e menos arriscado que o delito de
roubo, o tráfico é uma alternativa rápida, certa e segura para o
enriquecimento, independentemente do sexo, idade e classe social, mesmo porque
se trata de um crime em que a vítima busca a vitimização.
(c) houve aumento do poder aquisitivo do
brasileiro. A pobreza está diminuindo e a desigualdade está caindo. Estudo
realizado pela Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da
República mostra que, apesar da crise financeira global, entre 2008 e 2009, a
pobreza reduziu (no Brasil) de 25,3% para 23,9% da população (Valor Econômico
de 26.06.12, p. A4). Em dez anos, o recuo foi de 15,1 pontos percentuais, ou
seja, em 1999, 39% da população era considerada pobre, contra 23,9% em 2009 (30
milhões de brasileiros saíram da pobreza).
(d) muitos mercados estão correndo atrás
desses potenciais consumidores. Inclusive a criminalidade organizada. A melhora
do poder econômico do brasileiro nos últimos anos bem como a oferta mais
intensa de drogas (sobretudo depois das dificuldades de refino constatadas na
Colômbia) são fatores plausíveis explicativos tanto do (provável) aumento do
consumo das drogas como da superpopulação carcerária vinculada ao tráfico de
drogas (24% dos presos em 31.12.11, contra 13,4% em 2005, conforme informação
do Depen).
(e) em seis anos
quase duplicou o número de presos por força do tráfico de drogas. De acordo com
a teoria multifatorial (García-Pablos e Gomes: 2010, p. 282), para qualquer
evento na área criminal sempre vários fatores concorrem. Aos acima apontados
(aumento do poder aquisitivo do brasileiro e maior oferta das drogas) cabe
ainda agregar o fato de que muitos usuários de droga continuam sendo
etiquetados como traficantes. Pesquisa do Núcleo de Estudos da Violência da USP
constatou que o “pequeno traficante” é o grupo mais reprimido pela polícia.
Conforme o “Psicoblog” “A partir da análise de 667 autos de flagrante de
tráfico de drogas foi constatado que a média das apreensões é de apenas 66,5
gramas. Somente em 7% dos casos os detidos portavam mais de 100 gramas de
maconha, em 6,5% estavam com a mesma quantidade ou mais de cocaína. A pesquisa
ainda apontou que 57% dos acusados não apresentavam antecedentes criminais e
43% apresentaram algum registro, dos quais 17% haviam sido processados por
crime de tráfico.” Ou seja: tendencialmente pode-se afirmar que muitos usuários
estão sendo processados como traficantes e que “pequenos traficantes” estão
sendo processados como “grandes traficantes”. Isso está contribuindo para a
superlotação dos nossos cárceres, composto de “usuários ou pequenos
traficantes”, mesmo porque 84% desses presos não tiveram assistência jurídica
no momento da prisão.
(f) a
norteamericanização da política criminal repressiva também vem contribuindo
para a superlotação dos cárceres da miséria (como diz Vacquant), porque, para
lá, não vão somente os violentos (45%), sim, sobretudo, os não violentos (55%).
Deveríamos repensar, em relação a esse último grupo com certeza, a pena de
prisão.
GOMES, Luiz Flávio; BUNDUKY, Mariana Cury. Tráfico tomou lugar do
roubo como crime mais encarcerador do país. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3311, 25 jul.2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/22299>. Acesso
em: 26 jul. 2012.
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