TOMADA DE DECISÃO PELA POLÍCIA
Rosângela
Pereira de Abreu Assunção[1]
As
organizações empresariais modernas se caracterizam pela tomada de decisões baseada
em regras e precedentes, o que possibilita o estabelecimento de rotinas e padrões.
Na
organização policial, ao contrário, na maioria das vezes a polícia é direcionada
pelos eventos esporádicos com aparência, duração, extensão e potencial muitas
vezes incertos. Por exemplo, é possível predizer que cem roubos vão acontecer em
uma determinada cidade, durante um ano, mas são fatores imprevisíveis saber as datas,
os criminosos, as perdas de bens, os ferimentos nas vítimas e as respostas políticas.
Não existe na polícia uma teoria geral que lhe possibilita prever acontecimentos
que justifiquem e racionalizem totalmente suas práticas.
Assim,
tradicionalmente, a polícia se caracteriza pela tomada de decisões baseada numa
racionalidade situacional, que leva em conta as datas e os lugares específicos
dos eventos, em vez de uma série de regras e regulamentos firmes. (MANNING,
2003, p. 383)
Na
organização policial o processo de tomada de decisão apresenta algumas
peculiaridades:
1.
A decisão dos policiais tem por base um processo de triagem de pessoas e eventos
para um processamento posterior, permitindo que a polícia administre a justiça
e preserve os recursos organizacionais;
2.
as decisões da polícia envolvem os casos e as decisões orientadas politicamente
(estabelecimento de precedentes);
3.
a visibilidade da tomada de decisões pela polícia varia. Muitas das decisões
são virtualmente invisíveis ou de baixa visibilidade;
4.
a tomada de decisões pela polícia está marcada por grande complexidade e
heterogeneidade
(o objeto da conduta para controle da polícia varia enormemente, desde o mau
comportamento trivial até as grandes violações da lei criminal. Os julgamentos
do policiamento são influenciados pela percepção de trivialidade ou gravidade
de um ato ou evento).
5.
a escolha de agir é seguida pela pergunta “Como agir?” A polícia pode prender, escolher
não fazer nada ou dar conselho, advertir, ameaçar ou formalizar uma advertência.
Pode mandar as pessoas para outros órgãos ou, em brigas domésticas, proceder a
mediação de conflitos.
Devido
às peculiaridades acima mencionadas, é importante admitir que para um melhor processo
de tomada de decisão na organização policial deve-se considerar um modelo que
possibilite o alinhamento da Gestão do Conhecimento e a Gestão da Tecnologia da
Informação (TI), em prol da Análise Criminal, no sentido de um melhor controle
do fenômeno do crime e da violência.
A
INTELIGÊNCIA POLICIAL e a ANÁLISE CRIMINAL, consideradas como instrumentos de
produção de conhecimento, terão como princípio básico a coleta e o processamento
de dados, disseminando o conhecimento produzido sob a denominação de
informação.
A)
INTELIGÊNCIA POLICIAL:
é a informação sistematizada, classificada e analisada, que foi codificada em
categorias relevantes para a polícia. O processo de inteligência descreve o
tratamento dado a uma informação para que ela passe a ser útil para a atividade
policial.
O
processo de atividade de inteligência envolve o julgamento bem informado, um estado
de coisas, ou um fato singular.
Segundo
Manning (2003) a estratégia operacional não só disponibiliza, no tempo e
no espaço, policiais e outros recursos, mas também inclui a avaliação do número
de policiais designados para uma certa posição e, ainda, a distribuição das
posições.
As
estratégias operacionais podem ser classificadas em:
REATIVA:
responder a eventos em seguida ao recebimento passivo de pedidos por serviço.
PROATIVA:
quando o policial cria as condições de crime.
PREVENTIVA:
ações provenientes da polícia para alterar, prevenir ou intervir antecipadamente
nas situações.
Tradicionalmente,
a ação da polícia é principalmente reativa. Estas três estratégias se interagem
e não são mutuamente excludentes.
Por
outro lado, essas estratégias operacionais estão diretamente relacionadas com
as funções de inteligência da polícia.
A
Inteligência Policial adquire três formas:
INTELIGÊNCIA
PROSPECTIVA: é a informação coletada antes de um crime ou problema, com base na
identificação de alvos selecionados e com o desenvolvimento de alguma “teoria”
de base social, ou pela compreensão da natureza, da aparência e da frequência
do fenômeno a ser controlado.
INTELIGÊNCIA
RETROSPECTIVA: é a informação que resulta do curso normal do trabalho policial;
por exemplo, dos arquivos de prisões, das violações de trânsito e dos mandados
de prisão pendentes.
INTELIGÊNCIA
APLICADA: Busca associar nomes de suspeitos já anteriormente conhecidos com
atos conhecidos, ou é usada para conectá-los.
O
uso da inteligência aplicada pode exigir dados processados analiticamente, tais
como material forense e trabalho de inteligência ligando suspeito a hora,
lugar, oportunidade, motivo e outros.
Qualquer
forma de tecnologia da informação vai interagir com as funções de estratégia e
inteligência. Por exemplo:
•
Nas estratégias preventivas em que são usadas as inteligências prospectiva
e retrospectiva:
As
tecnologias são importantes para o armazenamento de dados, sua recuperação e
uso potencial.
•
Nas estratégias proativa em que são usadas as inteligências
prospectiva e
retrospectiva:
É
necessário o estabelecimento de alvos. A análise de redes e a tecnologia dos
computadores
são essenciais para grandes projetos que envolvam, por exemplo, o mapeamento
dos membros de um grupo de traficantes de drogas.
Poderão
ser feitas também o uso da informação de modo preventivo ou de análise, com a
ajuda de programas de computador específicos.
•
Nas estratégias reativa, com uso de inteligência aplicada e
retrospectiva:
O
uso estratégico mais importante das tecnologias de informação está associado a
essa estratégia. Essas estratégias usam inteligência aplicada e retrospectiva,
obtida através de informações, confissões, admissão de crimes conhecidos
anteriormente, ou entrevistas de suspeitos feitas por detetives.
Assim
que um crime possível tenha sido identificado e a polícia tenha informações
sobre seu conteúdo, pessoal, localização e consequências, são usadas tanto a
inteligência prospectiva como a retrospectiva. Por exemplo, a inteligência
aplicada é claramente ampliada pela comparação automatizada computadorizada das
impressões digitais.
Na
medida em que o propósito da tecnologia de informação é organizar e
sistematizar dados acumulados e armazenados existentes, e facilitar sua
recuperação, criando formatos com os quais se possa trabalhar, tal tecnologia
combina bem com o policiamento reativo.
Dados
sobre veículos roubados, placa de carros, cartas de motoristas, mandados
pendentes e fichas criminais estão entre os tipos sistematizados e rapidamente
disponíveis. Para situações onde um policial intervém e fica indeciso sobre a
situação do suspeito, sem saber se o detém ou prende, os sistemas
computadorizados podem ajudar na decisão a ser tomada.
Eles
vão fornecer as informações necessárias que permitem à polícia deter, e talvez
acusar, uma pessoa que, de outra forma, poderia não ser questionada nem presa e
acusada por um crime ou infração.
B)
Segundo Steven Gottlieb (1994) a ANÁLISE CRIMINAL é:
“Um
conjunto de processos sistemáticos (...) direcionados para o provimento de
informação
oportuna e pertinente sobre os padrões 2 do crime e suas correlações de tendências3,
de modo a apoiar as áreas operacional e administrativa no planejamento e 2 A
expressão Padrão corresponde a uma característica da ocorrência de um
determinado delito, segundo a qual pelo menos uma mesma variável daquela
ocorrência se repete em outra, ou outras ocorrências ao longo do tempo (antes
e/ou depois). Exemplo de variável repetida: o dia da semana, hora, local, tipo
de vítima, descrição do autor, modus operandi , etc... (Cfme, DANTAS; SOUZA
,2007) 3 A expressão Tendência, indica uma propensão quantitativa geral
(aumento, estabilização ou diminuição) de um fenômeno da segurança pública, por
exemplo: as ocorrências de um delito específico. Tal distribuição de recursos
para prevenção e supressão de atividades criminais, auxiliando o processo
investigativo e aumentando o número de prisões e esclarecimentos de casos.Em
tal contexto, a análise criminal tem várias funções setoriais na organização
policial, incluindo a distribuição do patrulhamento, operações especiais e de
unidades táticas, investigações, planejamento e pesquisa, prevenção criminal e
serviços administrativos (como orçamento e planejamento de programas).”
A
ANÁLISE CRIMINAL compreende, essencialmente, o ato de separar e examinar as diversas
partes do registro de um atendimento ou ocorrência policial, a fim de conhecer sua
natureza, proporções, funções e relações com variáveis homólogas de outras ocorrências.
A análise pode subsidiar uma pronta resposta tática, favorecendo prisões e esclarecimento
de casos. Diferentemente, pode estar voltada para questões estratégicas, caso
de potenciais problemas de segurança pública de médio e longo prazos.
Tipos
de Análise Criminal:
ANÁLISE
CRIMINAL TÁTICA: Identificam um padrão resultante das ações de um determinado
delinquente que comete uma série de crimes, do mesmo tipo penal, em uma mesma
localidade, e em um pequeno espaço de tempo. Provê informação de apoio às áreas
de pessoal (patrulhamento e investigação) na identificação de problemas criminais
específicos e imediatos e na prisão de delinquentes. Os dados da análise criminal
tática são utilizados para promover uma pronta resposta para situações operacionais.
ANÁLISE
CRIMINAL ESTRATÉGICA: está voltado para a determinação de um
padrão
geral de delinquência (por exemplo: arrombamentos) e que produz uma série de vítimas
tipicamente pertencentes a um mesmo grupo de risco (a exemplo, os comerciantes
de uma determinada cidade). Está, pois, voltada para “projeções de cenários”,
formulados a partir de variações dos indicadores de criminalidade. Ela inclui ainda
a realização de estudos e respectiva elaboração de planos para a identificação
e aquisição de recursos futuramente necessários. Um dos resultados típicos da
análise criminal estratégica é a formulação de programas preventivos.
ANÁLISE
CRIMINAL ADMINISTRATIVA: provê os gestores de informações gerais de natureza
econômica, social, geográfica, ou de outra área qualquer do conhecimento com
interface com a segurança pública. Está focada nas atividades genéricas de produção
de conhecimento. Tem como propósito instrumentar a gestão policial, o poder executivo
local, conselhos comunitários e grupos da sociedade organizada.
As
bases de dados constituem a matéria prima da Análise Criminal. As análises
podem apresentar alto valor tático ou estratégico se direcionadas para os
registros de categorias pontuais de dados sobre os crimes (dados de
materialidade, autoria e modus operandi) ou de informações genéricas (números
de delitos, índice ocorridos e respectivas taxas de propensão deve ser
verificada ao longo de uma área geográfica e série histórica extensas o suficientemente
para que a tendência possa ficar confiavelmente confirmada. (Cfme, DANTAS;
SOUZA, 2007) resolução). É de extrema importância a existência de uma base de
dados nacional que funcione como suporte mais abrangente e possibilite
resultados mais confiáveis e inclusivos.
A
Análise Criminal pode envolver o processamento de milhares de variáveis com o objetivo
de estabelecer as relações entre os dados constantes de uma base. Para tanto, é
preciso o auxílio de ferramentas da Tecnologia da Informação (TI)
indispensáveis para o processamento de grandes quantidades de dados. Várias
ferramentas da TI, destacando-se os Sistemas de Informação Geográfica (SIG)4
estão disponíveis para a Análise Criminal:
CrimeWatch, Crime Analysus
Extension, CrimeInfo, Crime Analyst, CrimeMapper, CrimeSolv, CrimeStat 2.0,
CrimeView, MapALI Desktop, GeoGenie, Rige, S-Plus, SpaceStat, Spatial Analyst,
STAC, Vertical Mapper, Terrain Tools, VMS 200 Video Mapping System, etc...
Finalidade
da Análise Criminal:
1.
produção de conhecimento relativo à identificação de parâmetros temporais e geográficos
do crime, bem como detectar a atividade e identidade da delinquência
correspondente.
2.
Identificar e prover de conhecimento sobre a relação entre dados de ocorrências
criminais e outros dados relevantes para os órgãos do Sistema de Justiça Criminal;
3.
Subsidiar ações dos operadores do sistema de justiça criminal (policiais –
análise criminal tática) bem como dos formuladores de políticas de controle
(gestores – análise criminal estratégica) “Com a utilização dos produtos de
análise, inquestionavelmente, é possível lidar mais efetivamente com incertezas
e ameaças contra a Segurança Pública.” (DANTAS; SOUZA, 2007)
4
Os Sistemas de Informação Geográfica (SIG) possibilitam o posicionamento
espacial de variáveis, incluindo a espacialização das ocorrências criminais,
distribuição de recursos humanos, bens e serviços, características
sócio-econômicas, etc. A utilização de ferramentas de SIG vem apoiando de forma
inovadora a gestão da segurança Pública na formulação de novas políticas,
programas e planos no que concerne a prevenção e repressão da criminalidade,
através da visualização imediata de tendências, padrões e outras regularidades
do fenômeno. Uma exemplo disso é a identificação de PONTOSQUENTES, locais de
alta densidade da criminalidade. (Cfme. DANTAS; SOUZA, 2007.
[1]
Rosângela de
Pereira de Abreu Assunção é professora da Academia de Polícia Civil de Minas
Gerais
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