domingo, 26 de agosto de 2012

Uso desnecessário de tecnologias no trabalho rouba 25% da jornada


 

Adilson Camargo
Um e-mail acaba de aparecer na caixa de entrada e o assunto chama a atenção, na sequência, o telefone toca, logo em seguida uma pessoa se aproxima da sua mesa para conversar, o twitter está repleto de notícias novas, os amigos não param de atualizar as mensagens no facebook.

Tem também o MSN, as infinitas opções da internet, enfim, motivos para interrompermos o que estamos fazendo não faltam. E isso dentro do ambiente de trabalho apresenta resultados nada animadores.

Supondo que durante uma jornada de oito horas, o profissional seja interrompido ou interrompa o que está fazendo por 12 vezes, e que cada interrupção consuma, em média, dez minutos do seu tempo (25% do tempo de trabalho). Ao fim do expediente, serão duas horas perdidas com essas paralizações. Se for levado em consideração o tempo gasto para nos concentrarmos novamente no que estávamos fazendo, o prejuízo é ainda maior.

Isso tudo somado resulta em queda de eficiência e de produtividade, o que atrapalha, inclusive, a carreira profissional de quem é afetado por estas constantes paralizações.

Afinal, a qualidade do trabalho apresentado poderia ser outra, bem melhor, se houvesse mais tempo e concentração. Mas como conseguir isso numa época em que não faltam motivos para a dispersão? Como impedir que os avanços tecnológicos, tão comemorados, transformem-se em vilões do nosso dia a dia?

Gislaine Magrini, psicóloga organizacional, recomenda limitar o uso de redes sociais e internet, por exemplo, a alguns horários fixos, como um pouco antes de iniciar o trabalho, no intervalo do almoço ou do lanche, e no fim do expediente. “(Estabelecer horários) é primordial para que se faça o uso saudável (da internet)”, orienta.

Mesmo utilizando a internet nesses horários fixos, a psicóloga diz que é preciso tomar cuidado. Principalmente com a exposição nas redes sociais. Criticar o chefe, a empresa ou o serviço tem de estar fora de cogitação. Da mesma forma, é preciso critério na hora de postar fotos. Elas podem significar um gol contra na carreira profissional.

Gislaine, que possui uma empresa de recrutamento e treinamento de recursos humanos, revela que já excluiu candidatos com base nas informações coletadas em suas páginas nas redes sociais. “É um jeito de conhecermos melhor o candidato”, comenta.

Jair José Marangoni, coach pessoal e profissional, também recomenda limitar o uso da internet para fins particulares dentro da empresa. Quanto aos e-mails, nada de perder tempo com eles. A orientação é abrir apenas o que é urgente ou pode ser útil para o trabalho e adiar a leitura do que foge disso.


Cafezinho

No quesito cafezinho, ele diz que é preciso parcimônia e bom senso na quantidade de vezes que faz uso desse expediente. A ordem é não exagerar. O mesmo vale para as paradinhas para o cigarro. Sobre as conversas paralelas, que nada contribuem para o desempenho profissional, embora Marangoni admita ser quase impossível extingui-las, ele recomenda que elas sejam evitadas a todo custo.

“Sei que é difícil controlar, até por conta da proximidade entre as pessoas. O ambiente favorece (as conversas paralelas). Isso acontece naturalmente. É tão natural que algumas pessoas, às vezes, se esquecem que estão dentro da empresa e não sala de casa ou na mesa de um bar de tão informal que é a conversa”, adverte.

De acordo com Marangoni, não é somente a imagem do trabalhador que fica arranhada com esse tipo de comportamento, mas também a da empresa, se isso afeta a qualidade do atendimento que é oferecido ao cliente. Esperar o funcionário terminar a conversa particular dele ao telefone ou com o colega de trabalho para depois ser atendido é algo que incomoda qualquer cliente.
 

Cérebro demora a retomar o foco

A cada interrupção do trabalho, o cérebro humano leva um tempo para retomar o pensamento do ponto em que parou. O tempo, porém, varia de acordo com a pessoa. “Tem aqueles que, a partir do momento que desfocam do que estão fazendo, até retornar ao que estavam fazendo antes demoram, em outros isso ocorre com mais rapidez”, diz a psicóloga e terapeuta cognitiva Mauricéia Quinhoneiro.

“Depende de pessoa para pessoa e também depende muito da motivação com o trabalho que ela está realizando”, completa. “Quanto mais envolvida na tarefa, mais rápida será a retomada do foco.” A terapeuta também lembra que o cansaço também pode interferir. “Pode ser que o profissional até esteja motivado para o trabalho, mas existe um limite. Tem horas que é preciso relaxar, pois a exaustão prejudica a capacidade de assimilação”, frisa.

Segundo ela, cada pessoa reage de forma diferente às interferências externas. Enquanto uns conseguem manter um bom nível de concentração em meio a um ambiente caótico e barulhento, outros apresentam mais dificuldades para se manter concentrado, ou seja, qualquer ruído pode ser um tormento.



Cada um é cada um

Mauricéia lembra que o silêncio para algumas pessoas favorece a criatividade, enquanto outras ficam entediadas com muito silêncio e produzem menos do que se estivessem em um ambiente mais turbulento, porque necessitam de adrenalina para “funcionar”. “É óbvio que precisamos buscar o equilíbrio. O caos, como regra geral, atrapalha a produtividade de qualquer profissional, mas por outro lado muita tranquilidade pode levar a um nível de relaxamento que nem sempre é produtivo”, destaca.

“(Manter o foco) depende do perfil de cada pessoa e do trabalho que está sendo realizado. Algumas profissões exigem uma concentração maior e qualquer coisa que atrapalhe representa um risco em termos de erros e pode prejudicar seriamente a qualidade final do serviço”, observa.

De acordo com ela, uma forma de amenizar esses riscos é adequar o perfil do profissional ao ambiente e ao serviço desenvolvido por ele. “Com uma boa supervisão, é possível atribuir tarefas de acordo com a capacidade e o perfil do profissional. Quando existe esse casamento, menor é o prejuízo para a produtividade”, argumenta Mauricéia.

Reforçando a importância da motivação com o trabalho a ser executado, a terapeuta frisa ainda que quando a pessoa tem a meta muito clara na cabeça do que ela precisa realizar é possível que fique menos vulnerável às quedas prolongadas por interrupção. “Isso porque ela está focada no que precisa realizar e está motivada.”

Por outro lado, quando o profissional está perdido em termos de organização do tempo e de prioridades, isso pode ser desastroso para o rendimento dele.

Outro aspecto importante citado pela terapeuta é a capacidade de adaptação da pessoa ao ambiente. “Aquele que se adapta melhor, acaba tendo mais chances de sucesso”, afirma. “Nem sempre o mercado oferece o ambiente ideal. Diante disso, é preciso se adaptar ao que temos no momento.”
 
Ossos do ofício

O advogado Gilberto Alonso Júnior precisa de concentração para, entre outras tarefas, analisar cadastros, cobranças, montar planilhas e fazer contratos de venda para a empresa onde trabalha. Mas, ao mesmo tempo, tem de estar disponível para atender clientes pessoalmente ou por telefone, além de estar sempre conectado e atento aos e-mails que chegam.

São interrupções que exigem dele a dedicação de um tempo, o que sempre o faz perder o fio da meada, mas Gilberto procura resolver da melhor maneira possível. Afinal de contas, são interrupções que fazem parte do seu trabalho.

Os e-mails pessoais ele acessa apenas no computador de casa. “Não faço isso no trabalho para não perder tempo”, comenta.
 
Ambiente propício


A maior parte das empresas aboliu as paredes e divisórias entre seus funcionários. Desta forma, o ambiente ficou mais arejado e, ao mesmo tempo, possibilita uma maior interação entre as pessoas. Parece que, sem as barreiras, as ideias circulam mais livremente. No entanto, facilita também a dispersão, qualquer ocorrência fora do normal chama a atenção de todos e a conversa é mais frequente.

Na avaliação de Jair José Marangoni, coach pessoal e profissional, a empresa e os funcionários têm mais a ganhar do que a perder com essa nova arquitetura do ambiente. Segundo ele, para isso é preciso regras claras e que elas sejam respeitadas. “É uma questão de gerenciamento interno.”

Ele próprio já atuou nos dois ambientes. E não tem saudades das divisórias. “Senti que a produção mudou para melhor quando acabaram com a separação entre os funcionários. A troca de informação ficou mais rápida. Houve uma humanização da produção do trabalho”, avalia. “O problema é a dispersão, mas temos de saber gerenciar isso.”

Gerenciamento. Essa é a palavra-chave, segundo Marangoni, para que a dispersão não atrapalhe a qualidade do serviço. Ele lembra que algumas interrupções são inevitáveis, pois fazem parte da própria natureza do trabalho. Ler e-mail, atender telefone, conversar, navegar pela internet talvez façam parte das atribuições profissionais. O importante é manter o foco no trabalho.

“O que se espera do bom profissional é que ele consiga gerenciar isso com eficiência”, afirma o coach. E, apesar das interrupções inevitáveis ou não, é importante não deixar que elas atrapalhem o desempenho do profissional. Afinal de contas, é a carreira que está em jogo.
 
É tudo uma questão de consciência

Os vilões da produtividade existem e “atacam” qualquer tipo de pessoa, a diferença está em como cada um usa o bom senso, e contra-ataca com organização, métodos e responsabilidades. A afirmação é de Rosana Ribeiro, analista de recursos humanos na Lecom, empresa de comunicação digital e tecnologia da informação.

Na opinião dela, o MSN, o telefone, o e-mail não precisam ser vilões. “Eles estão aí para facilitar a nossa vida. É uma regra simples que muitas vezes esquecemos. Cada momento tem seu objetivo, e se estes meios ‘atrapalham’ o alcance de seu objetivo, eles são vilões, se ajudam, são nossos ajudantes. Afinal, eles estão disponíveis tanto para a produtividade como para o desperdício de tempo. Então, é escolha de cada um o modo de usar”, aponta Rosana.

Ela toca também em um aspecto importante desta questão, que é o futuro profissional de quem se deixa levar por seguidas interrupções. “Uma pessoa que, em um período de quatro horas, atende mais de três telefonemas particulares ou responde mais de três mensagens no celular ou escreve mais de três e-mails que não tem a ver com o trabalho ou compartilham comentários no facebook, com certeza, tem um vilão muito sério não apenas no trabalho, mas em sua vida. Pois, na maioria das vezes, o funcionário não percebe que esse comportamento traz consequências para a evolução de sua carreira. Ele é ótimo tecnicamente, mas não consegue fazer um bom volume de entregas, pois tem problemas com a produtividade”, observa a analista.



Reações

Ela comenta que, normalmente, as empresas reagem quando se sentem afetadas com o uso inadequado de alguns destes instrumentos. Mas que não é possível, nem coerente, proibi-los.

Em vez disso, o melhor a fazer é procurar evitar que o uso desses meios possa ser um obstáculo para o trabalho do dia a dia.

O diretor de operações da Lecom, Tiago Amôr, reconhece a dificuldade para manter o foco o tempo todo no ambiente de trabalho. “As pessoas querem informação do mundo de fora, são curiosas, querem saber o que o amigo está fazendo, o que está acontecendo com o mundo, bater papo com alguém que faz tempo que não vê”, enumera.

Ele lembra que, hoje, com as mídias sociais, é possível dar parabéns a aniversariantes que antigamente nunca saberia que está aniversariando. “E as pessoas quase que se sentem obrigadas a fazer isso. Enfim, o volume de interrupções hoje é muito grande.”

Tiago considera, no entanto, que é preciso um momento de alívio para o cérebro, até pela natureza das atividades profissionais atuais. Antigamente, as pessoas trabalhavam com braços e agora usam a cabeça. É impossível ficar seis, oito, dez horas 100% focadas em uma atividade apenas. É necessário um descanso.”

Na avaliação dele, as pessoas têm de amadurecer para a definição de prioridades. “Isso cabe a cada um e não à empresa. A empresa precisa criar meios para que isso ocorra, mas se cada um conseguir ter essa consciência, o trabalho em equipe e a produtividade evolui e todos ganham”, afirma.
 

 

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