Um cartório de notas de Tupã (514 km de São Paulo) lavrou o que pode ser a primeira escritura de união conjugal entre três pessoas no país. O documento é semelhante aos contratos feitos entre casais do mesmo sexo antes de a união homoafetiva ser reconhecida pela Justiça, o que ocorreu em 2011, pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Segundo Claudia Domingues do Nascimento, tabeliã do cartório e redatora do texto, a escritura estabelece regras relativas aos bens dos parceiros, na hipótese de algum deles adoecer, morrer ou mesmo desistir da relação. “É como um contrato particular de compra e venda.”
A tabeliã afirmou que o trio tentou, sem sucesso, formalizar a escritura de união estável em outros cartórios. “Aí eles descobriram que minha tese de doutorado é sobre união poliafetiva [entre mais de duas pessoas] e me procuraram”, disse.
De acordo com ela, o trio é formado por um homem e duas mulheres, todos profissionais liberais, sem filhos, solteiros e residentes no Rio de Janeiro. “Eles se conhecem há muito tempo, e, desde 2009, passaram a viver uma relação estável.”
A tabeliã disse que existem muitas pessoas que vivem nessa situação, mas que não sabem que é possível formalizá-la em documento. “Eu estou surpresa com a repercussão desse fato. Estou sendo procurada por pessoas que vivem em condições semelhantes.”
Para Maria Amália Alvarenga, 49, professora e coordenadora do curso de direito da Unesp (Universidade Estadual Paulista) de Franca (400 km de São Paulo), o documento lavrado pelo trio em Tupã, embora inédito, “é inválido”.
O motivo, afirma, é o fato de a legislação, no Brasil, não amparar essa possibilidade de união. “Se eles querem proteger o patrimônio, têm de usar a legislação empresarial, não o direito de família.”
“Ofende os bons costumes”
A professora diz que para a união poliafetiva ser reconhecida, os interessados precisam ingressar com uma ação na Justiça. “Dificilmente conseguiriam esse reconhecimento, pois nem a união homoafetiva é aceita por todos os juízes.” Na opinião dela, a união poliafetiva “ofende os bons costumes e faz com que a noção de família vire uma bagunça”.
Angelo Faleiros Macedo, 48, tabelião substituto do 5º Cartório de Notas de Ribeirão Preto (313 km de São Paulo), pensa direrente. “A legislação ainda não prevê isso, mas as relações poliafetivas precisam ser protegidas. Elas existem de fato.” Segundo ele, a escritura feita em Tupã deverá provocar um aumento na procura aos cartórios para o registro de relações poliafetivas.
"No começo vai haver alguma dificuldade na elaboração do documento, pela novidade, mas depois será algo corriqueiro.” Os interessados, segundo ele, devem procurar o cartório com documentos pessoais.
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