A METAMORFOSE DA POLÍCIA JUDICIÁRIA
BRASILEIRA SOB A ÓPTICA DA EVOLUÇÃO DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS
Mário Leite de Barros Filho
Delegado de Polícia do Estado de São Paulo, professor
da Academia de Polícia de São Paulo, professor universitário, tutor do Ensino a
Distância, da Secretaria Nacional de Segurança Pública – SENASP e autor de
quatro obras na área do Direito Administrativo Disciplinar e da Polícia Judiciária.
Dados para contato: email: mario.leite2@terra.com.br
Sumário: I – Introdução; II – Evolução dos
Direitos Fundamentais – Direitos Fundamentais de Primeira, Segunda e Terceira
Geração; III – Relação entre a Evolução
dos Direitos Fundamentais e a Metamorfose da Atividade exercida pela Polícia
Judiciária; IV - Evolução do Perfil do Delegado de Polícia; V - Valorização
do Inquérito Policial; VI – Conclusão; e VII – Bibliografia.
Resumo: A presente matéria analisa a
metamorfose da atividade desenvolvida pela Polícia Civil sob a óptica da
evolução dos direito e garantias fundamentais.
Este trabalho estabelece
uma comparação entre a transformação
progressiva da atividade exercida pela Polícia Judiciária brasileira e a
evolução dos direitos fundamentais de primeira, segunda e terceira geração.
Finalmente,
o artigo em tela estuda os efeitos da evolução destes direitos nas atribuições
da Polícia Civil e no perfil do Delegado de Polícia.
Palavras
- chave: Polícia
Judiciária; Polícia Civil; Investigação Criminal; Justiça Criminal; Direitos
Fundamentais de Primeira, Segunda e Terceira Geração; Princípio da Dignidade da
Pessoa Humana; Mediação de Conflitos; Pacificador Social; Inquérito Policial;
Delegado de Polícia; Autoridade Policial; e Segurança Pública.
I
- Introdução
A presente
matéria estuda a transformação da atividade desenvolvida pela Polícia Civil sob
a óptica da evolução dos direito e garantias fundamentais.
A Polícia
Judiciária, em razão da natureza da atividade que exerce, acompanhou a evolução
dos direitos e garantias fundamentais, com o objetivo de atender aos anseios da
sociedade na área da segurança pública.
II – Evolução dos Direito Fundamentais
Antes de estudar a metamorfose
da atividade exercida pela Polícia Judiciária é oportuno examinar a evolução
dos direitos fundamentais.
A doutrina[1]
classifica os direitos fundamentais de primeira, segunda e terceira geração,
com base na ordem histórica cronológica em que foram reconhecidos pelas
Constituições.
Direitos Fundamentais de Primeira,
Segunda e Terceira Geração.
O conceituado constitucionalista
Alexandre de Moraes[2]
ensina que os direitos fundamentais de primeira geração são os direitos
individuais clássicos, chamados também de liberdades públicas, surgidos
institucionalmente a partir da Magna Carta.
A Carta Magna limitou, em 1215,
o poder dos monarcas na Inglaterra e deu origem ao movimento denominado
“constitucionalismo”.
Normalmente, são integrados
pelos direitos civis e políticos, dos quais são exemplo o direito à vida, à
intimidade, à inviolabilidade de domicílio etc.
Os direitos fundamentais de
segunda geração são denominados direitos positivos, pois, ao invés de limitar o
poder dos governantes, impõe ao Estado a obrigação de adotar medidas relacionadas
à diminuição dos problemas sociais.
Finalmente, os direitos
fundamentais de terceira geração defendem os chamados direitos de solidariedade
ou fraternidade.
Os direitos de terceira geração abrangem,
entre outros, o direito à paz social, à preservação do ambiente, ao
desenvolvimento econômico.
Saliente-se que os direitos de
terceira geração não se preocupam com um grupo determinado de pessoas, mas sim
com a coletividade.
III – Relação entre a Evolução dos
Direitos Fundamentais e a Metamorfose da Atividade exercida pela Polícia
Judiciária
Após estudar
a evolução dos direitos fundamentais, indaga-se:
Qual a relação existente entre a
evolução dos direitos fundamentais e a transformação da atividade exercida pela
Polícia Judiciária?
A resposta é simples: a Polícia
Judiciária, na condição de Instituição responsável pela elucidação dos crimes e
necessitando atender aos anseios da sociedade na área da segurança pública, foi
obrigada a adaptar suas atribuições de acordo com o desenvolvimento dos
direitos fundamentais, principalmente, no que se refere ao princípio da
dignidade da pessoa humana.
Extrai-se tal conclusão do
confronto entre a transformação progressiva da atividade de Polícia Judiciária e
a evolução histórica dos direitos fundamentais de primeira, segunda e terceira
geração.
A Atividade de Polícia Judiciária no
Contexto dos Direitos Fundamentais de Primeira Geração – Limitação do Poder do
Estado.
Inicialmente, o trabalho
executado pela Polícia Civil estava vinculado à imagem repressiva.
Durante o período da ditadura
militar, a atividade de Polícia Judiciária foi utilizada como instrumento
político.
A Atividade de Polícia Judiciária no
Contexto dos Direitos Fundamentais de Segunda Geração - Presença do Estado
Proporcionado Segurança à Sociedade.
Posteriormente, a Constituição
Federal de 1988, conhecida como Constituição Cidadã, conferiu expressamente à
Polícia Civil a atribuição de elucidação dos delitos – investigação criminal.
A Polícia Judiciária, então, assumiu
o papel de guardiã da segurança pública, como gestora das atividades policiais
repressivas do Estado.
A Atividade de Polícia Judiciária no
Contexto dos Direitos Fundamentais de Terceira Geração - Superação da Violência
e dos Conflitos
Finalmente, com a adoção dos
direitos fundamentais de terceira geração, descortina um novo horizonte para a
Polícia Civil na área da paz social, atuando na superação da violência e dos
conflitos.
Isto significa que, com a nova
ordem jurídica constitucional, a Polícia Civil se prepara para assumir o papel
de pacificadora social.
Constata-se, portanto, que, em
razão da evolução dos direitos fundamentais, as atribuições da Polícia Civil foram
ampliadas.
Efetivamente, as atribuições da
Polícia Judiciária, nos dias de hoje, não se resumem à investigação criminal - elucidação
das circunstâncias e autoria dos crimes, abrangem, também, a atividade de mediação
de conflitos decorrentes das infrações criminais de menor potencial ofensivo –
pacificadora social.
IV – Evolução do Perfil do Delegado de
Polícia
Por outro lado, o Delegado de
Polícia, para desempenhar o novo papel da Polícia Civil, precisou alterar seu
perfil profissional.
Antigamente, o Delegado de
Polícia era um servidor mais operacional, voltado somente à investigação
criminal.
Atualmente, o Delegado de
Polícia é um profissional mais sofisticado, um verdadeiro operador do direito,
que domina a ciência da investigação.
Ressalte-se que a inclusão da
atividade exercida pelos Delegados de Polícia no rol das carreiras jurídica,
além de atender aos interesses públicos, valorizou o trabalho desenvolvido
pelas Autoridades Policiais.
Neste sentido, registre-se que, recentemente,
foi aprovada na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo a Emenda
Constitucional nº 35/2012.
Os principais reflexos jurídicos
da norma em tela são:
- atividade exercida pelos Delegados de Polícia foi inserida no rol das carreiras jurídicas;
- a Polícia Judiciária passou a ser considerada atribuição essencial à função jurisdicional do Estado;
-
os Delegados de Polícia conquistaram a independência funcional, por intermédio
da livre convicção motivada dos atos de Polícia Judiciária; e
-
a exigência de dois anos de atividade jurídica para o ingresso à carreira de
Delegado de Polícia proporcionará a seleção de candidatos com mais experiência
e conhecimento na área do direito.
V – Valorização do Inquérito Policial
Ademais, o inquérito policial,
principal ato de Polícia Judiciária, também, se amoldou à nova ordem jurídica constitucional.
De fato, o inquérito policial
era considerado um procedimento dispensável, de natureza inquisitiva, meramente
preparatório da ação penal.
Acontece que a Constituição
Federal adotou o
princípio do devido processo legal, no inciso LIV, do art. 5º:
Art. 5º - (...)
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; (grifei)
O princípio do devido processo
legal é concebido como o conjunto de direitos, que garante uma investigação,
instrução e julgamento justo ao acusado.
Por força deste princípio, o
inquérito policial se transformou em um instrumento de defesa dos direitos e
garantias individuais, por intermédio da busca da verdade real, tendo como
destinatário o Poder Judiciário.
Vale lembrar que a Autoridade
Policial, por não ser parte, não se envolve e nem se apaixona pela causa
investigada.
Isto significa que o Delegado de
Polícia não está vinculado à acusação ou à defesa, agindo como um magistrado,
tem apenas compromisso com a verdade dos fatos.
VI - Conclusão
Conclui-se, portanto, que a Polícia
Judiciária sofreu verdadeira metamorfose profissional, evoluindo de mero coadjuvante
para assumir a condição de protagonista no cenário da segurança pública
nacional.
Mário Leite de Barros Filho
VII - Bibliografia
ARAUJO,
Luiz Alberto David. Curso de direito
constitucional / Luiz Alberto Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior. – 10ª.
Ed. ver. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2006.
BARROS
FILHO, Mário Leite de. Direito Administrativo Disciplinar da Polícia – Via
Rápida – Lei Orgânica da Polícia Paulista. 2ª ed., São Paulo/Bauru: Edipro,
2007.
BARROS
FILHO, Mário Leite de e BONILHA, Ciro de Araújo Martins. Concurso Delegado de
Polícia de São Paulo – Direito Administrativo Disciplinar – Via Rápida – Lei
Orgânica da Polícia Paulista. 1ª ed., São Paulo/Bauru: Edipro, 2006.
BONILHA,
Ciro de Araújo Martins. Da Prevenção da Infração Administrativa. São
Paulo/Bauru: Edipro, 1ª ed., 2008.
GOMES,
Luiz Flávio. Prisão e Medidas Cautelares: comentários à Lei nº 12.403, de 4 de
maio de 2011 / Alice Bianchini...(et al.); coordenação Luiz Flávio Gomes, Ivan
Luís Marques. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2011.
MELLO
TUCUNDUVA, Ricardo Cardozo. Emprego
de algemas: uso e abuso, São Paulo, 2010.
MORAES, Alexandre de. Direito constitucional / Alexandre de
Moraes. - 13. ed. - São Paulo: Atlas, 2003.
NUNES,
Luiz Antonio Rizzatto. Manual da Monografia Jurídica. São Paulo: Saraiva, 1997.
OLIVEIRA,
Regis Fernandes de e BARROS FILHO, Mário Leite de, Resgate da Dignidade da
Polícia Judiciária Brasileira. São Paulo: 2010 – Edição dos autores.
OLIVEIRA,
Régis Fernandes. O Funcionário Estadual e seu Estatuto. São Paulo: Max Limonad,
1975.
VERÍSSIMO
GIMENES, Eron e NUNES VERÍSSIMO GIMENES, Daniela. Infrações de Trânsito
Comentadas. 1ª ed., São Paulo/Bauru: Edipro, 2003.
[1] ARAUJO, Luiz Alberto
David. Curso de direito constitucional /
Luiz Alberto Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior. – 10ª. Ed. ver. e atual. –
São Paulo: Saraiva, 2006, páginas 116/118.
[2]
MORAES,
Alexandre de. Direito constitucional
/ Alexandre de Moraes. - 13. ed. - São Paulo: Atlas, 2003, pág. 60.
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