Numa sessão
que durou mais de sete horas e foi marcada por acirrados debates, o Conselho
Nacional de Justiça (CNJ) considerou ilegais as provas orais aplicadas por
desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) aos candidatos à
magistratura, no último concurso de ingresso para o preenchimento de 193 vagas.
A maior parte dos conselheiros afirmou que as perguntas não foram técnicas, mas
pessoais, e que as avaliações não seguiram critérios objetivos para avaliar o
preparo intelectual e o conhecimento jurídico dos candidatos.
Durante as
provas orais, que constituem a quarta etapa do concurso e são realizadas em
sessões fechadas, sem a presença de público, alguns desembargadores perguntaram
a candidatas grávidas se elas "não achavam que já começariam a carreira
como um estorvo ao Judiciário". No caso de candidatos vindos do Distrito
Federal, os desembargadores do TJSP afirmaram que "gente de Brasília não
costuma se adaptar a São Paulo" e indagaram se eles estavam
"convictos de seus propósitos". No decorrer das entrevistas, também
houve perguntas sobre a religião dos candidatos, a profissão de suas esposas e
a solidez de seus casamentos.
Por maioria
de 8 votos, o CNJ decidiu que 146 candidatos não aprovados na prova oral terão
o direito de refazer integralmente o exame e que as indagações dos
desembargadores terão de seguir critérios objetivos e técnicos. O CNJ também
decidiu que a prova deverá ser avaliada por uma nova banca examinadora e que as
entrevistas não poderão ser "secretas ou fechadas". No julgamento, os
conselheiros classificaram como "vícios graves e grosseiros" alguns
procedimentos da banca examinadora do Tribunal, como a realização de sessão
secreta de abertura das notas, não lançamento imediato da nota de cada
candidato em envelope lacrado e descarte dos envelopes antes do término do
concurso.
"Não se
compreende como pessoas experientes deixaram de cumprir procedimentos tão
simples. O conjunto da obra é absurdo", disse o relator do processo
administrativo, conselheiro Gilberto Valente. "Concursos públicos devem
primar pela imparcialidade dos julgadores e pela objetividade dos critérios.
Quanto maior a objetividade, maior a imparcialidade. Quanto mais se aproxima da
subjetividade, mais se afasta do preceito constitucional da imparcialidade.
Esse tipo de entrevista reservada seguiu o caminho inverso. Colocou-se em rota
frontal com a Constituição", afirmou o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal
Federal, ministro Ayres Britto.
A decisão do
CNJ aumentou ainda mais o já elevadíssimo nível de tensão entre o órgão e o
maior tribunal brasileiro, em número de juízes e processos. Quando chefiava a
Corregedoria Nacional de Justiça, a ministra Eliana Calmon acusou o TJSP de ser
a Corte mais "refratária" ao controle externo da magistratura, que
foi introduzido pela Emenda Constitucional n.º 45. "Sabe o dia em que vou
inspecionar esse tribunal? No dia em que o sargento Garcia prender o Zorro. É o
tribunal mais fechado a qualquer ação do CNJ", disse ela, em setembro de
2011.
Ao justificar
as perguntas de caráter pessoal feitas pelos desembargadores que integraram a
banca examinadora do último concurso de ingresso, a direção do TJSP alegou que
"elas não contaram para a nota". Ayres Britto refutou o argumento,
classificando as entrevistas fechadas como uma "prova psicotécnica
apreciada por regimes de exceção" e acusando a Justiça paulista de ter
"turbinado" a subjetividade. "É preciso salvar os examinadores
de si mesmos, para que não tenham a possibilidade de expressar suas simpatias e
antipatias", afirmou, depois de acusar o TJSP de ter desrespeitado a
Resolução 75 do CNJ, que estabelece as regras para entrevistas e provas orais
nos concursos de seleção de magistrados. O TJSP "tem um histórico de
descumprimento das regras do CNJ", disse o conselheiro Jorge Hélio.
Se tivesse
compreendido que o controle externo da magistratura foi implantado para valer,
a Justiça paulista não teria sofrido o constrangimento de ser enquadrada
novamente pelo CNJ - e, agora, de forma exemplar.
Fonte: O
Estado de S.Paulo
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