terça-feira, 10 de janeiro de 2012

QUESTÕES RELACIONADAS AOS BANCOS DE DADOS DE DNA

QUESTÕES RELACIONADAS AOS BANCOS DE DADOS DE DNA[1]
Norma Sueli Bonaccorso[2]

PRINCIPAIS QUESTÕES ÉTICAS

1 Princípios Éticos e suas Diretrizes

Segundo Comparato (2006, p. 626), “dentre os bens comuns a todo gênero humano e que devem, por conseguinte, ser preservados de toda apropriação particular, aparece, em primeiro lugar, como é óbvio, o genoma humano”.
Leite (2007, p.216), ao tratar da metáfora e crítica do gene como informação em suas Promessas do Genoma, lembra que, a valorização contemporânea do controle sobre a natureza é o ponto fraco da suposta neutralidade[3] erguida pela estratégia materialista de pesquisa em torno da tecnociência.
Ao pretender banir toda forma de valor em sua concepção de ciência, em relação à genômica, essa estratégia tem seu ponto cego na figura do gene como informação (e nas várias metáforas linguísticas para o DNA). De acordo com Azevedo (2003, p.323), ao eclipsar a dimensão semântica e pragmática do organismo, a noção de DNA informacional franqueia uma “sintaxe descarnada à mobilidade e à virtualidade” dos bancos de dados, ou seja, à apropriação e ao controle[4].
Na esteira dessas preocupações, têm-se os esforços da Bioética[5] e dos instrumentos lançados no sentido de coibir indevidas apropriações, como é o caso da Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos (UNESCO, 2003) e das Resoluções nº 196 (CNS/MS, 1996) e nº 340 (CNS/MS, 2004), ambas do CNS – Conselho Nacional de Saúde.
Nos dizeres de Boccatto (2008, p.24), vários foram os fatos e os documentos que tiveram impacto sobre a gênese e o desenvolvimento da Bioética. O Código de Nuremberg, de 1947, foi o marco inicial sobre a discussão da ética na pesquisa envolvendo seres humanos. Tal mandamento veio em virtude das atrocidades havidas durante a Segunda Guerra Mundial.
Vários deslizes éticos ocorridos na pesquisa biomédica norte-americana foram relatados por Belmont, em 1978 que, para reforçar o princípio da privacidade lançado pela Declaração de Helsinque (1954) sobre a ética médica, incluiu os princípios da autonomia, beneficência e justiça. Em 1979, Beauchamp e Childress acrescentaram o princípio da não-maleficência. A discussão desses princípios fez surgir uma corrente denominada principialista na Bioética.
Para Beiguelman (1997, p.525), segundo o princípio da privacidade[6], a informação genética e os resultados dos exames das pessoas devem ser confidenciais e continuar como tais mesmo depois da morte. Sem autorização explícita dos indivíduos examinados, essas informações jamais poderão ser reveladas a outras pessoas ou instituições públicas ou privadas, tais como escolas, associações, empresas ou companhias de seguro (CHARO, 2004, p.154-5).
De acordo com esse princípio, não se pode fazer o uso de amostras de material biológico de pacientes, o que inclui, evidentemente, o DNA, sem sua autorização expressa, a não ser que se preserve o seu anonimato. Contudo, Beiguelman (1997, p.525) salienta que, em casos de elucidação de crimes ou de investigação de paternidade, o princípio da privacidade poderá ser quebrado.
Levando-se em conta que atualmente inexiste qualquer dispositivo no Direito Penal pátrio[7] que obrigue suspeitos, indiciados ou acusados a doarem material biológico para realização de exames genéticos com o fito de elucidação do crime que lhe seja atribuído e muito menos qualquer previsão legal que autorize a criação de bancos de dados genéticos criminais, far-se-á a análise dos outros princípios da Bioética à luz dessas lacunas.
O princípio da autonomia relaciona-se com o consentimento livre e esclarecido dos indivíduos-alvo, de forma a tratá-los em sua dignidade, respeitá-los em sua autonomia e defendê-los em sua vulnerabilidade[8]. Sob este prisma, seu consentimento consciente, livre e esclarecido, deve ser dado após o recebimento de informações detalhadas, em linguagem acessível, de que ele não está obrigado a ceder material biológico, assegurando-lhe a inteira liberdade de escolha, sem quaisquer represálias.
E, nos casos relacionados com a justiça, se houver o assentimento do acusado, deve ainda existir o esclarecimento de que a prova obtida a partir de seu material biológico poderá contribuir para a sua condenação. E mais: tendo em vista a possibilidade de inserção de seu material biológico e/ou perfil genético em bancos de dados, far-se-á imprescindível também uma preleção aprofundada sobre os alcances e o significado dessa inserção.
Os princípios da beneficência e da não maleficência, que implicam a ponderação entre riscos e benefícios, podem ficar comprometidos se houver o negligenciamento do princípio da autonomia, levando à maximização do risco do próprio acusado contribuir involuntariamente para a sua condenação judicial na acusação presente e agora, no caso da possibilidade de sua inserção em banco de dados, de acusações futuras e pretéritas.
Os princípios da justiça e da equidade são atinentes à relevância social e devem promover vantagens para os envolvidos (instituição representante dos interesses da justiça e o acusado, quando for o caso), bem como minimizar o ônus para o sujeito vulnerável. Esses princípios podem também ficar comprometidos se não existir igualdade nos interesses dos envolvidos. Caso sejam ocultados do acusado os devidos esclarecimentos sobre seu direito à recusa, existirão gritantes vantagens para a instituição.

2 Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos

Dentre os instrumentos lançados para a sedimentação dos princípios basilares da Bioética, tendo em vista a proteção dos dados genéticos, são de se destacar dispositivos presentes na Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos e nas Resoluções nºs 196 e 340 do Conselho Nacional de Saúde.
É mister lembrar-se que, conforme assinala Romeo Malanda (2006, p.96), a Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos (UNESCO, 1997) pode ser vista como uma fonte de respostas a todos os desafios, tecnológicos, éticos ou jurídicos, surgidos com os avanços no campo de genética humana produzidos, na segunda metade do século XX, os quais não encontraram resposta na Declaração Universal dos Direitos Humanos, formulada em uma época em que a engenharia genética era menos que uma utopia.
A Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos, por sua vez, foi aprovada por unanimidade e aclamação, no dia 16 de outubro de 2003, no decurso da 32ª sessão, da Conferência Geral da UNESCO, prolongando a Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos[9], de 1997.
O objetivo da nova Declaração foi o de garantir o respeito da dignidade humana[10] e a proteção dos direitos humanos e das liberdades fundamentais em matéria de coleta, tratamento, utilização e conservação de dados genéticos humanos, em conformidade com os imperativos de igualdade, justiça e solidariedade.
Tem ainda o propósito de definir os princípios que deverão orientar os Estados na formulação das suas legislações e suas políticas sobre estas matérias[11]. Por isso, ela vem acompanhada de uma resolução de aplicação que compromete os Estados na adoção de todas as medidas apropriadas para promover os princípios nela enunciados e na promoção da sua aplicação e, para tanto, conta com o apoio do CIB - Comitê Internacional de Bioética da UNESCO e do CIGB - Comitê Intergovernamental de Bioética.
No que concerne ao presente estudo, valem ser destacados e comentados dessa declaração os seguintes dispositivos:

Art. 1º: Objetivos e âmbito [...]
(c) As disposições da presente Declaração aplicam-se à recolha, ao tratamento, à utilização e à conservação dos dados genéticos humanos, dos dados proteômicos humanos e das amostras biológicas, exceto na investigação, detecção e julgamento de casos de delito penal, e de testes de paternidade, que se regem pelas leis internas em conformidade com o direito internacional relativo aos direitos humanos (grifos nossos).

Interessante notar que tal dispositivo, de forma inteligente, demonstra respeito e zelo pelas diretrizes legislativas internas penais, ao mesmo tempo de já sinalizar os limites de lege ferenda, como é o caso do Brasil, em relação à criação de bancos de dados criminais de DNA.
Art. 2º: Definições [...]
(ix) Dados associados a uma pessoa identificável: dados que contêm informações como o nome, a data de nascimento e o domicílio, a partir dos quais é possível identificar a pessoa cujos dados foram recolhidos;
(x) Dados dissociados de uma pessoa identificável: dados não associados a uma pessoa identificável, por terem sido substituídas, ou dissociadas pela utilização de um código, todas as informações que permitiam identificar essa pessoa;
(xi) Dados irreversivelmente dissociados de uma pessoa identificável: dados que não podem ser associados a uma pessoa identificável, por ter sido destruído o nexo com qualquer informação que permitisse identificar a pessoa que forneceu a amostra;

Tais definições são imprescindíveis para que haja respeito ao princípio da dissociação de dados, exigido para o funcionamento seguro de um banco de dados criminais de DNA, como visto anteriormente.
Os dados previstos na alínea IX[12] são dados pessoais de qualificação e identificação do doador do material biológico e de vital importância para que se alcance o objetivo final desse tipo de banco de dados, qual seja, levar a elucidação de crimes.
Já os dados da alínea X correspondem àqueles dados de caráter tratados automaticamente, de modo a não permitir uma identificação direta da pessoa e de forma a garantir a proteção física e informática dos dados amparados, evitando qualquer risco de divulgação ilícita[13].
Os dados da alínea XI, na perspectiva de um banco de dados criminais genéticos, devem ser aqueles pertencentes às pessoas suspeitas de cometimento de ilícitos que doaram material biológico, tiveram seus perfis determinados, mas no confronto com outros perfis não apresentaram coincidência. Seus dados irreversivelmente dissociados podem permanecer no banco de dados apenas para fins estatísticos ou para servir como padrão de aferimento para melhoria do funcionamento do sistema informático, quando houver necessidade.

Art. 5º: Finalidade: Os dados genéticos humanos e os dados proteômicos só podem ser recolhidos, tratados, utilizados e conservados para fins de: [...]
(iii) medicina legal e processos civis ou penais e outros procedimentos legais, tendo em conta a alínea (c) do Artigo 1°(grifos nossos);

Este dispositivo delimita a pesquisa genômica e estabelece parâmetros para a criação de bancos de dados criminais de DNA quanto à sua função.

Art. 6º: Procedimentos [...]
(d) Do ponto de vista ético, é imperativo que sejam fornecidas informações claras, objetivas, adequadas e apropriada à pessoa a quem é solicitado consentimento prévio, livre, informado e expresso. Estas informações, além de fornecerem outros pormenores necessários, especificam as finalidades para as quais serão obtidos, utilizados e conservados os dados genéticos humanos e dados proteômicos da análise das amostras biológicas. Estas informações deverão, se necessário, indicar os riscos e consequências em causa. Deverão igualmente indicar que a pessoa poderá retirar o seu consentimento sem coerção e que daí não deverá resultar para ela qualquer desvantagem ou penalidade.

Tal dispositivo foi aqui destacado por se relacionar com a alínea (a) do art. 9º que será posteriormente tratada.

Art. 8º: Consentimento [...]
(a) O consentimento prévio, livre, informado e expresso, sem tentativa de persuasão por ganho pecuniário ou outra vantagem pessoal, deverá ser obtido para fins de recolha de dados genéticos humanos, de dados proteômicos humanos ou de amostras biológicas, quer ela seja efetuada por métodos invasivos ou não invasivos[14], bem como para fins do seu ulterior tratamento, utilização e conservação, independentemente de estes serem realizados por instituições públicas ou privadas. Só deverão ser estipuladas restrições ao princípio do consentimento por razões imperativas impostas pelo direito interno em conformidade com o direito internacional relativo aos direitos humanos (grifos nossos).

Da mesma maneira que os dispositivos da alínea (c) do art. 1º e III do art. 5º, esse dispositivo estabelece parâmetros para a criação de bancos de dados criminais de DNA.

Artigo 9º: Retirada do consentimento
(a) Quando são recolhidos dados genéticos humanos, dados proteômicos humanos ou amostras biológicas para fins de investigação médica e científica, o consentimento pode ser retirado pela pessoa envolvida, salvo se os dados em questão forem irreversivelmente dissociados de uma pessoa identificável. Em conformidade com as disposições do artigo 6° (d), da retirada do consentimento não deverá resultar qualquer desvantagem ou penalidade para a pessoa envolvida (grifos nossos);
(b) Quando uma pessoa retira o seu consentimento, os seus dados genéticos, os seus dados proteômicos e as suas amostras biológicas não deverão voltar a ser utilizados a menos que sejam irreversivelmente dissociados da pessoa envolvida.
(c) Se os dados e as amostras biológicas não estiverem irreversivelmente dissociados, deverão ser tratados de acordo com os desejos da pessoa em causa. Se tais desejos não puderem ser determinados ou forem irrealizáveis ou perigosos, os dados e as amostras biológicas deverão ser irreversivelmente dissociados ou destruídos (grifos nossos).

Os dispositivos das alíneas (a), (b) e (c) do art. 9º só merecem destaque se a estruturação do banco de dados genéticos criminais não prever que a coleta do material biológico se dê de forma compulsória. A permanência de amostras biológicas e de dados irreversivelmente dissociados poderá servir a finalidades estatísticas ou de aferimento de funcionamento do sistema, como anteriormente foi comentado.

Artigo 10º: Direito a decidir ser ou não informado dos resultados da investigação
Quando são recolhidos dados genéticos humanos, dados proteômicos ou amostras biológicas para fins de investigação médica e científica, as informações fornecidas na altura do consentimento deverão indicar que a pessoa em causa tem direito a decidir ser ou não informada dos resultados. Esta cláusula não se aplica à investigação sobre dados irreversivelmente dissociados de pessoas identificáveis nem a dados que não conduzam a conclusões individuais relativas às pessoas que participaram na referida investigação. Se necessário, o direito a não ser informado deverá ser tornado extensivo aos familiares identificados dessas pessoas que possam ser afetados pelos resultados (grifos nossos).

É importante salientar que este dispositivo poderá se prestar ao exercício da ampla defesa e do contraditório do acusado, uma vez sendo informado sobre seu perfil genético, poderá ele confirmar o resultado auferido, tendo em vista a possibilidade de ocorrência de erros laboratoriais e humanos. Além disso, tendo em vista a possibilidade da busca familiar nos bancos de dados criminais, torna-se crucial que o direito de informação seja estendido aos familiares do acusado.

Artigo 12°: Recolha de amostras biológicas para fins de medicina legal ou de processos civis ou penais ou outras ações legais
Quando são recolhidos dados genéticos humanos ou dados proteômicos humanos para fins de medicina legal ou de processos civis ou penais ou outras ações legais, incluindo testes de paternidade, a colheita de amostras biológicas in vivo ou ‘post mortem’ só deverá ter lugar nas condições previstas pelo direito interno, em conformidade com o direito internacional relativo aos direitos humanos (grifos nossos).

Aqui também o dispositivo anterior veio estabelecer limites para a pesquisa genômica, bem como parâmetros para a criação de bancos de dados criminais de DNA, no que concerne à coleta de amostras.

Artigo 13°: Acesso
A ninguém deverá ser recusado o acesso aos seus próprios dados genéticos ou dados proteômicos a não ser que os mesmos sejam irreversivelmente dissociados da pessoa que é sua a fonte identificável ou que o direito interno restrinja o acesso no interesse da saúde pública, da ordem pública ou da segurança nacional (grifos nossos).

No comento a este dispositivo, cabe observar sua generalidade ao se referir a dados genéticos. É certo que alguns tipos de pesquisa genômica poderiam gerar dados, cuja divulgação oferecesse risco significante à saúde ou a ordem pública ou mesmo à segurança nacional. Contudo, o risco causado pelo acesso à informação gerada pelo perfil genético destinado à identificação criminal, pelo que se conhece até então, é nulo.
Para minimizar os prejuízos que a restrição ao acesso aos dados genéticos do acusado possa trazer à ampla defesa e ao contraditório, pode-se sugerir que seus dados genéticos sejam irreversivelmente dissociados, ainda que não seja demonstrada sua inocência.

3 Resoluções do Conselho Nacional de Saúde

A Resolução nº 196 do CNS, de 10 de outubro de 1996, dá as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos, incorpora, sob a ótica do indivíduo e das coletividades, como afirma seu próprio texto, os quatro referenciais básicos da Bioética: autonomia (com previsão para a existência de um termo de consentimento livre e esclarecido), não maleficência, beneficência e justiça, visando assegurar os direitos e deveres concernentes à comunidade científica, aos sujeitos da pesquisa e ao Estado.
Tais princípios se apresentam didaticamente expostos em seu texto e foram anteriormente comentados.
Em relação à Resolução nº 340 do CNS, de julho de 2004, pode-se afirmar que ela veio em consideração da necessidade de serem observados os riscos potenciais à saúde e à proteção dos direitos humanos, das liberdades fundamentais e do respeito à dignidade humana na coleta, processamento, uso e armazenamento de dados[15] e materiais genéticos humanos. Tal Resolução incorpora todas as disposições contidas na Resolução nº 196, da qual esta é parte complementar da área temática específica. No que possa ser relacionado à temática dos bancos de dados genéticos criminais, é de se destacar nela os seguintes dispositivos:

III - Aspectos Éticos: [...]
III.11 - Os dados genéticos resultantes de pesquisa associados a um indivíduo identificável não poderão ser divulgados nem ficar acessíveis a terceiros, notadamente a empregadores, empresas seguradoras e instituições de ensino, e também não devem ser fornecidos para cruzamento com outros dados armazenados para propósitos judiciais ou outros fins, exceto quando for obtido o consentimento do sujeito da pesquisa (grifos nossos).

As previsões desse dispositivo além cuidarem da conservação do direito à privacidade, acentuam a imperiosa necessidade de um termo de autorização para que se faça, com propósitos judiciais, cruzamento dos dados genéticos auferidos do material do doador com outros dados armazenados. Essa medida, dado os alcances de suas exigências, vem em prol da defesa dos direitos humanos.

V - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE):
V.1 - O TCLE deve ser elaborado de acordo com o disposto no capítulo IV da Resolução CNS nº 196/96, com enfoque especial nos seguintes itens: [...]
f) informação quanto a medidas de proteção de dados individuais, resultados de exames e testes, bem como do prontuário, que somente serão acessíveis aos pesquisadores envolvidos e que não será permitido o acesso a terceiros (seguradoras, empregadores, supervisores hierárquicos etc.), com grifos nossos.

As medidas aqui previstas, apresentadas de modo concentrado, são as mesmas previstas de forma dispersa na Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos. Tal dispositivo, além de respeitar o princípio da autonomia, trata de exigir medidas de proteção de dados pessoais e genéticos.


VI - Operacionalização: [...]
VI.3 - Cabe à CONEP a aprovação final das pesquisas em genética humana que incluam:
b) armazenamento de material biológico ou dados genéticos humanos no exterior e no País, quando de forma conveniada com instituições estrangeiras ou em instituições comerciais (grifos nossos).

Diferentemente da Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos, esse dispositivo usa especificamente a terminologia armazenamento de material biológico ou de dados genéticos. Quando se faz menção a dados genéticos, refere-se, em última instância, à possibilidade de formação de bancos informatizados com os dados gerados pela pesquisa e aí cabem todas as observações já feitas sobre as cautelas a serem tomadas em prol dos direitos humanos.
Quanto ao armazenamento de material biológico, sob o ponto de vista do processo penal pátrio, haverá sempre de existir, desde que haja condições (relacionadas à exiguidade e ao estado de conservação do material biológico) para tal. Esta necessidade decorre basicamente do exercício do contraditório e da ampla defesa, pelos mesmos motivos anteriormente abordados.
Como corolário desses princípios e com a reforma introduzida pela Lei nº 11.690/08 no art. 159 do Código de Processo Penal (CPP), tem-se a possibilidade de nomeação de assistentes técnicos (art. 159, §3º do CPP) que também poderão examinar os materiais remanescentes da perícia realizada (art. 159, §6º do CPP), fazendo ampliar o exercício do contraditório[16] e reforçando a necessidade de armazenamento de material[17],[18].
Outros dispositivos que corroboram essa necessidade são os art. 170 do CPP, relacionado com a necessidade de guarda de material para eventual nova perícia, e o instituto da revisão criminal.
Conforme Queijo (1998, p.9), a revisão criminal (art. 621, III do CPP) se apresenta diretamente vinculada ao erro judiciário, denotando-se daí sua grande importância. Salienta a autora que o erro, na revisão, não diz respeito, fundamentalmente, a uma falha produzida pelo juiz, mas sim ao conhecimento equivocado da realidade. Desta maneira, diante do surgimento de provas novas, subjaz que o juiz prolator da sentença condenatória questionada teria proferido sua decisão com base em conhecimento viciado, pela falta de elementos adequados.
Na doutrina, dentre outras situações, podem ser acolhidas pelo dispositivo do art. 621, III do CPP a prova de álibi, encontro do objeto subtraído, confissão de um terceiro e até mesmo descobertas científicas posteriores à condenação que invalidem os fundamentos da sentença. As provas novas podem ter sido descobertas anteriormente à sentença, mas não ter sido produzidas. Elas poderão ser produzidas por todos os meios legalmente admitidos (QUEIJO, 1998, p.218).
É possível, então, pretender-se a desconstituição da condenação criminal, com base em provas novas pelo surgimento de novas tecnologias, como é o caso da prova de DNA. Para tanto, o restante do material original, caso exista, que deve ficar armazenado por tempo indeterminado ou até que se esgote, demonstrando-se, assim, a necessidade de instalação dos centros de custódia de vestígios e provas nos institutos periciais, o que, aliás, acabou sendo reconhecido pela Lei nº 11.690/08 quando reza, no §6º do art. 159 do CPP, que o órgão oficial manterá sempre[19] a guarda do material probatório que serviu de base à perícia, salvo se for impossível a sua conservação.
Sobre a revisão criminal, é interessante ainda notar, como observa Gomes (2008, p. 154-5), que embora no CPP “não esteja prevista a possibilidade de utilização da revisão criminal para fazer aplicar um novo entendimento jurisprudencial favorável ao condenado”, sendo, por isso, comum o indeferimento desse tipo de pedido pelos tribunais, aos poucos, por graça da jurisprudência, este tipo de ação tem sido mais aceito, não só no Brasil, fazendo com que se realizem amplamente as garantias do principio da legalidade penal. Um exemplo característico desse tipo de realização é o citado Projeto Inocência, desenvolvido nos Estados Unidos, em 1989. Grande parte dos ex-condenados por erros judiciais foi liberada com base em exames de DNA.
De acordo com o Conselho Nacional de Pesquisa norte-americano - NRC (1992, p.163), as considerações éticas com relação ao uso da tecnologia do DNA na ciência forense acabam se sobrepondo a uma série de questões sociais e legais que incluem direitos reais e processuais das pessoas e os custos e benefícios globais não financeiros resultantes do estabelecimento dessa tecnologia nos processos.
Neste campo é interessante ainda fazer notar uma proposta de justificação no campo da Bioética. De acordo com Feldhaus (2003, p.174), Richard Hare chama de ladeira escorregadia a objeção frequentemente suscitada quando se pretende a introdução ou mudança de uma determinada teoria ou de um comportamento. É o processo pelo qual, uma vez admitido um determinado comportamento, fica facilitada a progressão para outro comportamento, alinhado com o primeiro, porém, ainda menos admissível.
Richard Hare defende que não estar sujeito a uma objeção é muito importante para qualquer concepção ética ou Bioética em função do uso frequente que se faz dela contra os bioeticistas. Dessa maneira, a demonstração de que a concepção não está submetida a este tipo de crítica torna-se um meio de defesa da própria concepção, pois a ladeira escorregadia é uma objeção à capacidade da própria teoria de conseguir determinar o âmbito do que é e do que não é moralmente correto (FELDHAUS, 2003, p. 174).
Na apresentação de um estudo sobre problemas bioéticos relacionados com a formação de banco de dados de DNA para identificação humana, Moreira e Guimarães Neto (2003, p.I) afirmam que a ladeira escorregadia, neste tipo de banco de dados, pode ser refutada pelo fato de as informações genéticas reveladas não possuírem caráter passível de significação social e, portanto, nenhum potencial discriminatório do indivíduo, para além da comparação de amostras.
Entretanto, na atualidade, já se aventa a hipótese de que no futuro os alelos do perfil genético, derivados da análise de regiões do DNA não codificadores, possam sim revelar características fenotípicas do indivíduo. Conforme alerta Fidalgo (2006, p.119), a única segurança que se tem é a de que, caso se descubra que um marcador genético possa informar algo além da simples identificação do indivíduo, ele deixará de ser utilizado[20]. Lembra ainda a autora que, ainda que se centre apenas nos aspectos positivos dos testes de DNA (celeridade e fiabilidade), não se pode olvidar que o “que se procura no processo penal não é a verdade a todo o custo – nem tudo o que é cientificamente possível é, simultaneamente, processualmente aceitável”.
Ainda temos as observações de Etxeberria Guridi (2007, p.48), no sentido de que a Agência Espanhola de Proteção de Dados de Caráter Pessoal, em um informe de 2000, sobre o tratamento de dados genéticos para a localização de pessoas desaparecidas ou sob investigação criminal, considerando que em todo caso, sempre se está diante de dados relacionados com a saúde das pessoas. Desta forma, antecipando a discussão sobre os efeitos da análise de DNA codificante ou não codificante, deve ser assinalado que, ainda que não sejam derivados diretamente de dados da saúde do indivíduo, os resultados compõem o perfil genético de uma pessoa e, portanto, se encontram intimamente relacionados com a saúde[21].
Alude ainda o autor que esta potencialidade de se obter informação essencial do indivíduo através da análise de DNA levou alguns autores a se referir a um cidadão transparente ou de cristal[22]. Etxeberria Guridi (2007, p.49) diz ainda que não irá tardar, por tal motivo, que se consagre nesses casos o conceito de intimidade genética como mais uma manifestação do direito às intimidade do art. 18.1 da Constituição Espanhola[23].

ASPECTOS ÉTICO-LEGAIS DA COLETA DE AMOSTRAS BIOLÓGICAS PARA EXAMES DE DNA

1 O consentimento Informado

O consentimento informado, conforme salienta Patrão Neves (2003, p.488), na sua expressão anglo-americana, ou consentimento esclarecido, consoante a uma proposta de reformulação da expressão original por parte de uma Europa Latina, ou simplesmente o consentimento[24], designa a anuência explícita a uma proposta de ação biomédica que pode ter diferentes especificações, de acordo com o âmbito da investigação.
O ato de consentimento deverá ser consciente, ou seja, a pessoa tem que ser competente do ponto de vista psíquico e também jurídico, para o aspecto preciso, concreto e singular a que se refere aquela sua autorização[25]. Esse ato tem que ser, simultaneamente, voluntário, isto é, a pessoa deve estar livre para dar ou recusar o seu consentimento em qualquer momento do processo em causa[26].
Na concepção de Lorente Acosta (2002, p.11), não há dúvida alguma que o principal problema ético-legal, relacionado com a coleta de amostras biológicas, surge com a possibilidade de uma negativa de consentimento[27], por parte do suspeito, acusado ou condenado, para retirada de material que sirva de referência, pois isso pode afetar a capacidade de elucidação de crimes.
O consentimento informado é um requisito para a prática de qualquer atuação médica e, por extensão, para a prática de qualquer ação sobre uma pessoa, tal qual seria a coleta de sangue, cabelos, saliva ou qualquer outro fluido ou tecido biológico.
As circunstâncias especiais para a elaboração da prova penal implicam, por um lado, a suposta falta de colaboração e, por outro lado, a necessidade de informação das consequências jurídicas que podem derivar de sua realização. As provas formadas na investigação são muitas vezes imprescindíveis para averiguar a identidade do autor e podem conduzir a existência de outras provas ou indícios que relacionem o acusado aos fatos.
Devido essa grande importância, Lorente Acosta (2002, p.11) afirma que “o juiz pode substituir o consentimento do acusado por meio de uma decisão motivada para que o ato médico se torne lícito”, nos casos de recusa[28]. Contudo, ressalta que
[...] conscientes de que as regras jurídicas variam segundo o país que se considere, de modo genérico e baseado na Constituição Espanhola de 1978, nos atrevemos a assinalar que seriam, na maioria dos países, direitos que, em caso de ausência de legislação específica, se violariam se se pretendesse forçar uma pessoa a dar uma amostra biológica sem seu consentimento:

1.      Direito à liberdade de locomoção
2.      Direito à integridade física
3.      Direito a não fazer prova contra si mesmo
4.      Direito a não se declarar culpado
5.      Direito à presunção de inocência

[...] esses pontos vão de servir basicamente como referência diante dos parlamentos dos diferentes países que hão de valorar como uma legislação específica sobre banco de dados poderia interferir nesses direitos fundamentais (LORENTE ACOSTA, 2002, p.12).

2 A Coleta de Amostras de Suspeitos no Brasil

A Declaração Universal dos Direitos dos Homens, adotada e proclamada pela Resolução 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948 estabelece, em seu artigo XI, que:

Toda pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa.

Não é então por outro sentido que a Constituição da República de 1988, através de seu artigo 5º, inciso LV, assegura ao acusado direito ao contraditório e à ampla defesa. Pela mesma Carta, são também assegurados outros direitos e garantias ao acusado. Dentre eles podem ser citados os contidos nos incisos X, XLIX, LIV, LVI, LVII e LXIII do artigo 5º, respectivamente, direito à intimidade; se preso, garantia de respeito à sua integridade física e moral; garantia do devido processo legal; garantia do princípio de presunção de inocência; garantia de serem inadmissíveis contra ele provas obtidas por meios ilícitos e o direito de permanecer calado.
Essas garantias, aliadas ao princípio nemo tenetur se detegere (ninguém está obrigado a fazer prova contra si mesmo), princípio processual ligado ao devido processo legal que se realiza pelo exercício do direito ao silêncio, se aplicam como garantias de não estar o acusado obrigado a fazer prova contra si.
Em relação ao direito ao silêncio, pode-se entender ainda que se o silêncio do réu não pode ser mais interpretado em prejuízo da defesa, o mesmo devendo acontecer em relação à sua recusa em doar material para o exame de DNA. Diante da presunção de inocência, não se pode constranger o acusado ao fornecimento de provas, nem de sua negativa inferir veracidade o fato (GOMES FILHO, 1997, p.119; DOTTI, 2000, p.275-6).
A coleta forçada[29] ou involuntária do material para feitura de exame de DNA caracteriza uma das formas de obtenção ilícita da prova, o que é inadmissível no sistema legal brasileiro[30],[31], além de ferir outras garantias constitucionais acima citadas (GOMES FILHO, 1994, p.1; MENDRONI, 2003, p.5).
Juridicamente a assinatura do termo de coleta pelo acusado garante formalmente que a prova formada a partir de seu material biológico foi licitamente obtida[32], podendo, assim, compor o rol dos elementos colocados à disposição do juízo para a formação da livre convicção sobre autoria do crime perpetrado.
Para tanto, a Resolução SSP/SP 194/99, que estabelece normas para coleta e exame de materiais biológicos para identificação humana no Estado de São Paulo, prevê em seu art. 6º que em toda coleta de material biológico de pessoas vivas, suspeitas, vítimas ou parentes consanguíneos de primeiro grau e de envolvidos em crimes seja lavrado um termo de coleta.
Em resposta à criminalidade, há um consenso popular em defesa da possibilidade de realização compulsória do exame, pela argumentação de que o interesse da defesa social (proteção da sociedade) justificaria o desrespeito aos direitos e garantias do acusado.
No Estado Democrático de Direito o sistema jurídico deverá sempre ser permeado pelo princípio da razoabilidade. Este princípio coloca em conflito o respeito aos direitos do acusado, consagrados processual e constitucionalmente, e os interesses da sociedade.
Em prol do acusado, vale ressaltar que a Constituição Federal de 1988 impõe, como um dos fundamentos principais para o Direto Penal, o respeito à dignidade humana, limitando o poder de punir do Estado[33], determinando, assim, uma nova orientação na aplicação das normas penais (CAMARGO, 2002a, p.120; GARGANI, 1993, p.1331; HADDAD, 2007, p.234-5; WELTER, 2002, p.86-7).
Encarados sob esta nova orientação, os interesses da sociedade, mesmo que contemplados pela coleta compulsória, não podem significar uma aspiração de condenação do acusado, uma vez que, sob este enfoque, não é a relação de causalidade, isto é, a comprovação da existência de um fato, que induz à condenação. A responsabilidade criminal e a pena devem ser analisadas sob o prisma da necessidade[34] e proporcionalidade (CAMARGO, 2002a, p.125).
Entretanto, não se pode compactuar com certas vantagens que muitos acusados podem auferir pela recusa em fornecer material biológico no decorrer da persecução penal e nem com o desrespeito aos dispositivos legais em prol dos interesses da sociedade.
Faz-se necessária, então, a exemplo de legislações estrangeiras, mudança legislativa, que pacifique a questão, tornando obrigatório o fornecimento de material biológico quando exista suspeição da prática de crimes graves que causem danos relevantes a bens jurídicos protegidos, bem como ainda preveja a possibilidade de formação de dados genéticos dos condenados[35] por estes crimes.
Particularmente, acredito que a investigação criminal, mesmo quando autorizada a se valer de técnicas invasivas, não deve ser instrumento para a busca desmedida da verdade real. Os limites desta busca são delimitados pelos direitos e garantias individuais coroados na Constituição Federal, que acabam por determinar que a verdade a ser buscada não é a real, mas a possível.
Por outro lado, acredito também que esses direitos e garantias não possuem caráter absoluto e, em situações nas quais haja ofensa a bem jurídico e colisão de princípios relacionados a interesses divergentes, estas garantias devem ser necessariamente abrandadas.
O princípio da convivência de liberdades e razões de interesse público relevantes legitimam o poder público para a aplicação de medidas de restrição, desde que sejam respeitados os limites estabelecidos pela Constituição. Nenhuma garantia ou direito não pode ser exercido em detrimento da ordem pública ou em detrimento de terceiros.
Partidária desta linha de raciocínio, como disse acima, acredito que a criação de um banco de dados genéticos criminais, se estabelecido por parâmetros legais adequados e que se limite à coleção dados de condenados por crimes graves, como aqueles praticados contra a dignidade sexual e aqueles praticados com o uso de violência, principalmente aqueles que atentem contra a vida.

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[1] Texto reformatado e adaptado pela autora de capítulos de sua tese de doutorado intitulada “Aspectos técnicos, éticos e jurídicos relacionados com a criação de bancos de dados criminais de DNA no Brasil” (2010), disponível em <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-04102010-141930/pt-br.php>.
[2] Bacharel, Mestre e Doutora em Direito Penal pela USP. Perita Criminal e Professora da ACADEPOL.
[3] Vão neste sentido Garrafa e Porto (2003, p. 35) quando afirmam que “cresce a utilização indiscriminada da justificativa Bioética como ferramenta metodológica neutral, fato que ameniza e mesmo anula a gravidade dos diferentes problemas, mesmo aqueles que redundam nas mais profundas distorções sociais”.
[4] Em sua avaliação acerca dos aspectos éticos da pesquisa em genética humana, no contexto de países em desenvolvimento, Azevedo (2003, p.323) identifica como um dos capítulos de sua temática aquele especialmente direcionado às implicações éticas da pesquisa genômica. A autora destaca o poder conferido pelo conhecimento do DNA de pessoas, povos e nações, isto é, o DNA-poder. Ressalta que “nesse cenário, somente a rigorosa observância do compromisso ético celebrado entre o Estado, pesquisadores e a sociedade oferece formas de disciplinar o acesso ao DNA-poder”.
[5] Alerta Benatar (2003, p.25) que “um enfoque de suma importância no contexto do moderno debate bioético tem sido redesenhar as relações médico-paciente. O fortalecimento dos vulneráveis está se conseguindo com a ênfase nos direitos humanos e no respeito pela dignidade individual. No entanto continuam os desequilíbrios de poder no contexto dos cuidados da saúde. Numa extensão considerável isto se relaciona com uma insuficiente atenção para com a justiça social. Tais desequilíbrios de poder, somados ao desenvolvimento de novas formas de poder, por exemplo, a nova biotecnologia genética, levantam o espectro de crescente injustiça social”.
[6] Segundo Romeu Casabona (1996, p. 84), devem ser distinguidos os conceitos de privacidade e intimidade. A intimidade são aquelas manifestações da personalidade individual (ou familiar), cujo conhecimento ou desenvolvimento são reservados a seu titular ou para as pessoas sobre as quais ele exerce alguma forma de controle quando terceiros estão envolvidos (particulares ou poderes públicos). A privacidade constitui um conjunto mais amplo, mais global, que a intimidade. São facetas da personalidade que, isoladamente consideradas, podem carecer de significação intrínseca, mas que coerentemente enlaçadas expressam como um retrato precipitado da personalidade do indivíduo que possui o direito de manter reservado.
[7] Ao tratar das declarações da Unesco sobre Bioética e dados genético humanos, Rodríguez (2008, p.217) afirma que na ausência de definições normativas seguras no direito interno, em virtude da pouca confiança do legislador em se posicionar diante de questões novas ou emergentes, a regulamentação da pesquisa e do tratamento de dados genéticos tem-se dado por meio  de instrumentos da chamada soft law. Como fonte não formal de Direito Internacional, em contraposição aos tratados e convenções internacionais – denominados, em contraposição, hard law -, esse tipo de declaração não é juridicamente vinculante, “à falta de instrumento de responsabilização pelo descumprimento de seus preceitos. Daí afirmar-se que ‘o caminho mais comum para construir a definição de soft law parte do confronto entre esses instrumentos e os tratados e convenções internacionais. Da contraposição desses dois tipos de instrumentos emerge como elemento distintivo a noção de juridicamente vinculante; por meio da ratificação de um tratado ou convenção, as partes contraem obrigações jurídicas e podem ser responsabilizadas pela violação ou não-cumprimento, o que não ocorre quando adotam um instrumento soft law”.
[8] Kottow (2003, p.71) observa que a vulnerabilidade intrínseca da existência humana é até certo ponto protegida pela sociedade. Afirma o autor que “afora essa vulnerabilidade, os seres humanos são afetados por vulnerabilidades circunstanciais em decorrência da pobreza, da falta de acesso à educação, das doenças e da discriminação. A destituição impede as pessoas de atender às suas necessidades e realizar seus desejos, predispondo-as a infortúnios adicionais. A privação restringe as capacidades e a liberdade, requerendo por isso ações terapêuticas específicas que minorem a destituição. A Bioética tem particular preocupação com essa vulnerabilidade secundária e circunstancial por causa dos riscos que correm as pessoas vulneráveis de ser prejudicadas pela exploração advinda de ações biomédicas”. No mesmo sentido, Macklin (2003, p.59), destaca que a questão da vulnerabilidade tem grande amplitude, abrangendo grande número de áreas da ética clínica, da ética de pesquisa e da ética nas políticas públicas.
[9] De acordo com Séguin (2001, p.70), o Conselho Europeu estuda a proposta de incluir a intangibilidade da herança genética no rol dos direitos humanos. Neste sentido, Ropsigliosi (2007, p.10) alerta que todas as constituições do mundo defendem os direitos humanos, “já que estes são a coluna vertebral que permite a existência de uma sociedade. Contudo, a biotecnologia é uma das principais fontes de violação destes direitos hoje em dia e, em consequência, deve ser vigiada pela constituição”.
[10] De acordo com Costa (2008, p.37), “[...] atualmente não mais se concebe o Estado de Direito como uma construção formal: é preciso que o Estado respeite a dignidade humana e os direitos fundamentais para que possa ser considerado um Estado de Direito em sentido material. O Estado de Direito legitima-se pela subordinação à lei e, ao mesmo tempo, a determinados valores fundamentais, consubstanciados na dignidade humana. A dignidade como fundamento jurídico não se resume, todavia, a traduzir e expressar as escolhas políticas, desempenhando também importante função no que se refere aos direitos fundamentais. A dignidade humana é o fundamento filosófico e jurídico dos direitos fundamentais e se expressa juridicamente, em grande medida, por meio dos direitos fundamentais, como ressalta Celso Lafer: ‘O valor da pessoa humana enquanto valor-fonte da ordem de vida em sociedade encontra sua expressão jurídica nos direitos fundamentais do homem’”. Mora Sánchez (2001, p.94) assevera que “La Constitución Española de 1978 consagra en su artículo 10.1 la dignidad de la persona <<como uno de los fundamentos del orden político y de la paz social, vedándose las prácticas que la degraden>>. La Constitución Española ha elevado a valor jurídico fundamental la dignidad de la persona, siendo un valor espiritual y moral inherente a la propia persona, que se manifiesta singularmente en la autodeterminación consciente y responsable de la propia vida, llevando consigo la necesaria pretensión de respeto por parte de los demás”.
[11] Segundo Piovesan (2009, p.XIII), “Enquanto um construído histórico, os direitos humanos não traduzem uma história linear, não compõem um marcha triunfal, nem tampouco uma causa perdida. Mas refletem, a todo tempo, a história de um combate, mediante processos que abrem e consolidam espaços de luta pela dignidade humana”.
[12] Pizzolante (2002, p.89), ao abordar as limitações quanto à utilização de dados pessoais componentes de bancos de dados, lembra do acolhimento constitucional português dos denominados dados sensíveis. O sistema contratual português, tal qual como estatuído em sua constituição, proíbe taxativamente o tratamento de dados sensíveis e os elementos assim considerados são aqueles que digam respeito a convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa, vida privada e origem racial ou étnica, bem como o tratamento de dados relativos à saúde e à vida sexual, incluindo os dados genéticos. Salienta o autor que “o tratamento de dados sensíveis somente poderá dar-se em hipóteses excepcionais previstas em caráter restritivo pela própria lei, e que se prendem a motivos de interesse público e assim mesmo mediante disposição legal ou autorização da Comissão Nacional de Proteção de Dados ou, no caso de dados referentes à saúde e à vida sexual, aí incluídos os dados genéticos, a permissão para seu tratamento limita-se à hipótese comprovada de sua necessidade para efeitos de medicina preventiva, diagnóstico médico, prestação de cuidados ou tratamentos médicos ou de gestão de serviços de saúde, e desde que esses dados sejam tratados por profissional de saúde ou outra pessoa sujeita a sigilo ou segredo profissional, tendo sido tal tratamento de dados notificado à Comissão Nacional de Proteção de Dados, e desde que sejam ainda garantidas medidas de segurança da informação”.
[13] De acordo com Mora Sánchez (2001, p.273), alguns autores europeus, estudiosos do Direito público, apregoam a existência de um novo direito fundamental, no âmbito dos arquivos informatizados de dados pessoais, que se denominaria liberdade informática ou direito de autodeterminação informativa. No mesmo sentido, Nicolás Jiménez (2006, p. 85) “[...] se trata de datos personales...”.
[14] De acordo com Queijo (2003, p. 244-6), “há provas no processo penal que, para sua produção, exigem intervenção corporal no acusado. Como define Ângel Gil Hernández, a intervenção corporal é a realização de atos de investigação ou obtenção de provas no corpo do próprio acusado. Para a produção das mencionadas provas, além do nemo tenetur se detegere, outros valores que também constituem direitos fundamentais estão envolvidos: o direito à liberdade, à intimidade, à dignidade humana e à intangibilidade corporal. As provas que implicam intervenção corporal no acusado podem ser invasivas ou não invasivas. Consideram-se invasivas as intervenções corporais que pressupõem penetração no organismo humano, por instrumentos ou substâncias, em cavidades naturais ou não. Entre as provas invasivas podem ser enumeradas diversas perícias, como exames de sangue em geral, o exame ginecológico e a identificação dentária, e, ainda, a endoscopia e o exame do reto, que são frequentemente empregados em buscas pessoais. A busca pessoal também denominada revista, pode ser realizada por meio de intervenções corporais invasivas ou não invasivas, As provas não invasivas compreendem outras tantas perícias, como exames de matérias fecais, os exames de DNA realizados a partir de fios de cabelos e pelos; as identificações dactiloscópica, de impressões dos pés, unhas e palmar e também a radiografia empregada em buscas pessoais”. No mesmo sentido, Mazzucuva e Pappalardo (1999, p.489); Felicioni (1999, p.504-5).
[15] Ao estudar as constituições latino-americanas que preveem remédios contra a manutenção de dados individuais em cadastros ou bancos de dados informatizados ou não, Pizzolante (2002, p. 93) observa que “a par de não conterem dispositivos específicos pertinentes à proteção da privacidade representada pelos dados pessoais, mormente aqueles considerados sensíveis em seus textos constitucionais, diversos países da América Latina preveem institutos adequados ao conhecimento de informações contidas em bancos de dados informatizados ou não, valendo-se, consoante o modelo constitucional brasileiro, do instituto do habeas data, tenham ou não assim denominado literalmente seus mecanismos de proteção aos dados referentes aos seus cidadãos”. No mesmo sentido, Mora Sánchez (2001, p.275).
[16] Conforme Gomes Filho (2001, p.41), “Num segundo momento, de participação ativa propriamente dita, o contraditório engloba um amplo e complexo feixe de prerrogativas, poderes e faculdades utilizadas pelas partes, que convergem para a obtenção de um resultado favorável por intermédio do processo. Dentre elas, destacam-se especialmente as atividades relacionadas à prova dos fatos que fundamentam as pretensões das partes, pois são estas que tiveram contacto com os mesmos fatos e estão mais aptas a demonstrá-los ao processo; por isso mesmo, são também as partes que possuem os melhores elementos para contestar e explorar as provas trazidas pelo adversário, possibilitando ao julgador uma visão mais completa (e mais crítica) da realidade”.
[17] No sentido de incrementar a guarda de materiais destinados não apenas a exames de DNA, com o apoio e parceria de instituições privadas, a Superintendência da Polícia Técnico-Científica de São Paulo tem planos para a instalação de um centro de custódia de vestígios e provas. Trata-se de um organismo centralizador de segurança, destinado à guarda de materiais, substâncias, instrumentos e objetos a serem periciados, já periciados ou com perícia em andamento e, no tocante à sua experimentação, o Laboratório de DNA do Instituto de Criminalística de São Paulo vem servindo como protótipo deste centro (BONACCORSO, 2005, p.54).
[18] Conforme Grinover, Fernandes e Gomes Filho (2001, p.153), “maior dificuldade poderá surgir quanto às perícias realizadas na fase policial, sem prévia manifestação da defesa e que, muitas vezes, representam a comprovação da própria materialidade do crime. Excluídos os casos em que há urgência, seja porque há risco de desaparecerem os sinais do crime, seja porque é impossível ou difícil conservar a coisa a ser examinada...”.
[19] Távora e Antonni (2008, p.40), observam que, como a lei é omissa a respeito de por quanto tempo o material deve ficar armazenado, deverá, então, aguardar-se ao menos até a prolação da sentença.
[20] É o que reza o item III.2 da Resolução do Conselho da União Europeia (2001/C 187/01), de 25 de junho de 2001, relativa ao intercâmbio de resultado de análises de DNA (CUE, 2001).
[21] Neste sentido também Mora Sánchez (2001, p. 118).
[22] No mesmo sentido, Mora Sánchez (2001, p. 277).
[23] Art. 18.1. Se garantiza el derecho al honor, a la intimidad personal y familiar y a la propia imagen. Disponível em: <http://www.der.uva.es/constitucional/verdugo/18.html>. Acesso em: 15 jul. 2011.
[24] Nos dizeres de Patrão Neves (2003, p.488), “a origem da noção de consentimento no domínio hoje designado por biomédico é, como se sabe, jurídica. O evento que assinala sua gênese ocorreu em 1914, nos Estados Unidos, e reporta-se ao conhecido caso Schloendorff vs. Society of N.Y. Hospitals. Schloendorff queixa-se de lhe ter sido removido um tumor sem o seu consentimento, vindo o tribunal a pronunciar-se sobre o ‘direito’ que ‘todo ser humano de idade adulta e de mente sã tem a determinar o que será feito com o seu corpo’”. Já a expressão consentimento informado surge, pela primeira vez, em 1957, no pronunciamento jurídico relativo ao caso Salgo vs. Leland Stanford Jr. University Board of Trustees. Esse caso se refere à questão de se decidir se a injeção ministrada durante um exame vascular poderá ter afetado a medula espinhal do queixoso e se, quer esse, quer sua família, foram previamente informados da realização do exame (aortografia translombar). O tribunal decidiu que, atendendo à natureza do procedimento, o consentimento informado deveria ter sido solicitado, acrescentando ainda que este só é válido quando apresenta os riscos do procedimento e as alternativas ao mesmo.
[25] O objetivo do princípio do consentimento informado é aumentar a autonomia pessoal das decisões que afetem o bem-estar físico e psíquico. A pessoa autônoma é a que não somente delibera e escolhe seus planos, mas é capaz de agir com base nessas deliberações. Conforme Diniz (2007, p.611), “esse direito de autodeterminação dá origem ao dever erga omnes de respeitá-lo, fundamentado no princípio da dignidade da pessoa humana”.
[26] De acordo com Hammerschmidt (2007, p.158), “o consentimento informado foi desenvolvido para manter o equilíbrio da escolha autônoma do indivíduo e pela necessidade de tornar explícito entre pesquisado e sujeito da pesquisa”.
[27] Neste sentido, Dezem (2008, p.195) afirma que “a prova do DNA nada mais é do que exame pericial e, como tal, está sujeita às regras próprias das perícias. Contudo, com um detalhe: por se tratar de intervenção corporal, há necessidade de consentimento do acusado na produção dessa prova pericial, de forma que esteja presente o elemento volitivo da tipicidade processual. Ausente o consentimento, não poderá ser admitido este meio de prova; e, além disso, não poderá ser extraída qualquer consequência negativa para o acusado diante do exercício de faculdade”.
[28] Até 2002, isto era fato na Espanha, porque o artigo 391-3 da LECRIM permitia ao juiz ordenar ao acusado a coleta de material biológico, porém sem que se empregasse qualquer tipo de coação. Se o acusado se negasse a cumprir a ordem judicial deveria responder pelo delito de desobediência. Contudo, não era pacífica a aceitação desse mandamento legal, entendendo parte da doutrina que se tratava dispositivo inconstitucional (CUESTA PASTOR, 2002, p.89). Contudo, de acordo com Ollé Sesé (2008, p.1-2), uma disposição do Ministério da Economia, em 2002, em cumprimento ao que estabelecia a lei vigente de proteção aos dados pessoais, mandou que fossem suprimidos os dados criminais genéticos dos bancos de dados espanhóis, de forma que o uso de marcadores genéticos estava reduzido exclusivamente para a identificação de cadáveres e determinação de parentesco. Para solucionar o problema, os artigos 326 e 363 da LECRIM tiveram sua redação modificada pela Lei Orgânica 15/2003, permitindo a obtenção de DNA dos suspeitos, sob autorização judicial em caso de recusa. Porém, como ressalta Curiel (2008, p.2), com a edição da Lei Orgânica 10/2007 fica contemplada a tomada de amostras biológicas de suspeitos, ainda que sem autorização desses, mas desde que sejam por método não invasivo (swab oral com células das bochechas). Entretanto, conforme assinala o próprio texto legal, na terceira disposição adicional: “[…] La toma de muestras que requieran inspecciones, reconocimientos o intervenciones corporales, sin consentimiento del afectado, requerirá en todo caso autorización judicial mediante auto motivado, de acuerdo con lo establecido en la Ley de Enjuiciamiento Criminal”.
[29] Conforme Couceiro (2004, p.351-359), em seus estudos ao tratar do fornecimento de material gráfico ou biológico, afirma que “discute-se, no âmbito cível (por exemplo, as ações de investigação de paternidade) e no âmbito penal (por exemplo, a necessidade do exame da acusada para demonstrar a materialidade do crime de auto-aborto, previsto no art. 124 do CP), se a pessoa pode ser obrigada a se deixar examinar, ou se tem direito de não fornecer material gráfico ou biológico para análise. A questão não é pacífica nas democracias ocidentais. Também o fornecimento de material biológico (sobretudo sangue, para verificação de embriaguez na condução de veículo) tem causado grande discussão nas legislações modernas, prevalecendo a ideia de que a recusa em colaborar pode ser considerada crime. Quanto ao fornecimento de escritos, o art. 174, IV, do CPP determina que ‘quando não houver escritos para a comparação ou forem insuficientes os exibidos, a autoridade mandará que a pessoa escreva o que lhe for ditado. Se estiver ausente a pessoa, mas em lugar certo, esta última diligência poderá ser feita por precatória, em que se consignarão as palavras que a pessoa será intimada a escrever’ (no mesmo sentido, a art. 344, d, do CPPM). Diante de tal contexto, seria concebível constranger a pessoa a fornecer material que levasse à sua própria incriminação? Não. A negativa a se submeter à prática de exame deve implicar apenas em indício de culpabilidade, invertendo o ônus da prova. Se for certo que tal inversão não é bastante, por si só, para invalidar o princípio da presunção de inocência, não menos correto é afirmar que a mesma pode ser cotejada com as demais provas, permitindo inferência contra o agente, para validamente embasar o decreto condenatório. Tal interpretação, como acima mencionado quanto ao direito ao silêncio, não significa acabar com a garantia que proíbe seja o agente compelido a fornecer prova contra si mesmo. Apenas procura equilibrar os valores em jogo na apuração dos fatos no processo penal”.
[30] Neste sentido, vêm os dizeres de Pitombo (2004, p. 10): “O preso tem direito de ser informado do exame de DNA (art. 5º, inc. LXIII, da CR), sendo-lhe facultada a recusa ao fornecimento de material, porque inviolável sua integridade física e moral na Lei Maior (art. 5º, inc. XLIX, da CR). Sem falar do direito à preservação do próprio corpo, do Novo Código Civil (art. 13 do CC). O Estado não pode, por sua vez, obter material genético sem o consentimento da pessoa humana, nem a lei poderia prever situação onde a investigação criminal se sobreporia aos referidos valores constitucionais inerentes à dignidade do Homem, porque estes apresentam importância maior na ordem axiológica dos direitos na Constituição da República”.
[31] Neste aspecto, interessante observar as ponderações feitas por Fernandes (2002, p.84-6), ao comentar a prova ilícita na Constituição Federal: “não é fácil, contudo, atingir o ponto de equilíbrio. De um lado, é necessário armar o Estado de poderes suficientes para enfrentar a criminalidade, crescente, violenta, organizada; por outro, deve o cidadão ter garantida a sua tranquilidade, a sua intimidade, a sua imagem, e, principalmente, ser dotado de remédios eficazes para se contrapor aos excessos e abusos dos órgãos oficiais. Não se pode, em nome da segurança social, compreender uma garantia absoluta da privacidade, do sigilo, no processo penal, mas também não se pode conceber, em homenagem ao princípio da verdade real, que a busca incontrolada e desmedida da prova possa, sem motivos ponderáveis e sem observância de um critério de proporcionalidade, ofender sem necessidade o investigado ou o acusado em seus direitos fundamentais e no seu direito a que a prova contra si produzida seja obtida por meios lícitos. [...] Contudo, vai tomando corpo entre nós a aceitação da teoria da proporcionalidade, visando-se a evitar a aplicação muito rígida do inc. LVI do art. 5º quando a ofensa a determinada vedação constitucional é feita para proteção de valor maior também garantido pela Constituição”.
[32] “A vedação à produção de provas por meios ilícitos (art. 5º, inc. LVI, da CR) passa, antes de mais nada, pelo crivo dos ditames constitucionais, ficando impedido o legislador ordinário de excepcioná-los. Nem se poderia imaginar lei que autorizasse funcionários públicos a enganarem o cidadão comum, com objetivo de lhe retirar  material genético para fim de exame, pois se estaria perante desrespeito à regra da moralidade na Administração Pública (art. 37 da CR). Até mesmo porque tal indivíduo vive em estado de inocência, até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória (art. 5º, inc. LVII, da CR). Ademais, a possibilidade de a informação, proveniente do exame de DNA, vir a fazer parte de um banco de dados, também pede a prévia ciência e aprovação do examinado, pois ele tem o direito à autodeterminação informacional (art. 5º, inc. LXII, da CR), isto é, ‘direito mais amplo que concede a todos os cidadãos o direito de acesso a todos os dados que lhe digam respeito (quer sejam tratados informática ou manualmente), podendo exigir a sua retificação ou atualização, bem como o direito a conhecer a finalidade com que é construída a sua base’” (PITOMBO, 2004, p.10).
[33] Nos dizeres de Camargo (2002b, p.21), “esta atuação do Estado, através do Direito Penal, exige, além da ultima ratio, o atendimento das formalidades previstas em lei e a observância dos direitos fundamentais, que decorrem da dignidade humana, por tratar-se do instrumento mais violento que existe no âmbito social, porque, em geral, estabelece restrições à liberdade, que devem ser suportadas como última e grave consequência, pelo indivíduo ou grupo social”.
[34] De acordo com Moraes (2008, p.38), “O requisito da necessidade, também denominado da ‘intervenção mínima’, da ‘subsidariedade’ ou ‘da alternativa menos gravosa’, por sua vez, ‘obriga os órgãos do Estado a comparar medidas restritivas aplicáveis que sejam suficientemente aptas à satisfação do fim perseguido e a eleger, finalmente, aquela que seja a menos gravosa para o direito dos cidadãos’”.
[35] Neste sentido, nunca será demais reforçar o entendimento de que “na esteira da concepção humanitária da pena, o preso não deve sofre restrições maiores do que aquelas previstas na lei e, ainda assim, a punição deve ser executada nos limites da sentença. Dessa feita, em que pese ter sua liberdade restringida por força da condenação criminal, o preso continua sendo sujeito de direitos, não podendo ser privado das garantias constitucionais previstas aos cidadãos, com exceção, é claro, daquelas cuja supressão seja consequência da prática do delito” (CLEMENTE, 2008, p.304).

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