No dia 3 de julho, o jogo do bicho completará 120 anos de operação e, no dia 3 de outubro, serão 71 anos de proibição pela Lei de Contravenções Penais.
A legislação proibitiva não alterou o cenário de ilegalidade do jogo no Brasil, que movimenta mais de R$ 12 bilhões anualmente em apostas clandestinas.
Além disso, o país tem uma das legislações mais atrasadas do mundo na área de jogos e loterias.
É equivocada a tese de que a legalização de bingos, cassinos e jogo do bicho acabaria favorecendo o crime organizado. Na verdade, ambiente propício às máfias é o atual, com o jogo ilegal movimentando mais que os R$ 9,73 bilhões das loterias da Caixa Econômica Federal, sem nenhuma contrapartida para Estado e sociedade.
Se o governo controlasse, certamente os recursos do jogo clandestino não seriam caso de polícia, mas sim significativa fonte de receita para investimentos sociais, bem como importante instrumento de geração de empregos, como registrado nos países que acolheram o jogo no seu sistema jurídico, porque perceberam que existindo demanda um “empreendedor” vai prestar o serviço.
Discursos que usam patologia, lavagem de dinheiro e ausência de controle como argumentos contrários são parte do lobby dos que pretendem manter o jogo na ilegalidade.
Afirmar que o Estado não tem condições de controlar e fiscalizar estas operações é uma falácia. A Caixa controla on-line mais de 33 mil terminais instalados em 11 mil lotéricas de 4.437 municípios. A Receita Federal tem um dos sistemas de controle do Imposto de Renda mais competentes do mundo e a Justiça Eleitoral controla 420 mil urnas eletrônicas com resultado em apenas cinco horas. Com toda tecnologia disponível, chega a ser risível o argumento de que estas atividades são propícias a lavagem de dinheiro.
Já o comportamento patológico não é privilégio dos jogos de azar, podendo ser observado em várias outras atividades. Pesquisadores estimam que de 1% a 4% da população têm uma relação doentia com o jogo.
No Brasil não existem dados seguros sobre a situação devido à clandestinidade, mas o conceito mundial de ludopatia vem mudando com a introdução do sistema de “autoexclusão”, que pode ser requerido pelo apostador ou por um familiar.
Em entrevista ao GLOBO, o presidente da comissão instalada pelo Senado para reforma do Código Penal, ministro Gilson Dipp, informou que a comissão pretende criminalizar os jogos de azar.
O poder público poderá criar uma nova anomalia ao criminalizar esta atividade, sem antes criar um marco regulatório para este setor.
Toda proibição é discutível e às vezes inútil.
A Lei Seca nos Estados Unidos é um exemplo a ser observado.
A proibição do jogo no Brasil também não resolveu a ilegalidade do centenário jogo do bicho.
Deve-se pensar bem antes de transformar as boas intenções em novos negócios para o crime organizado. Quem quiser jogar e não puder fazê-lo de acordo com a lei, irá buscá-lo no mercado negro, pois sempre haverá um “empreendedor” para dar à sociedade o que a sociedade deseja.
MAGNHO JOSÉ é jornalista.
Fonte: Jornal o Globo
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