segunda-feira, 15 de julho de 2013

MP-SP quer órgãos próprios de inteligência e perícia

 

No calor das discussões sobre a PEC 37, o Ministério Público de São Paulo, silenciosamente tenta criar órgãos próprios de inteligência e de perícias.
Para tanto, enviou dois projetos à Alesp, um Projeto de Lei e outro de Lei Complementar, onde cria os cargos e funções de agente de informações e peritos para suprir a futura estrutura organizacional.
Trata-se de iniciativa que busca, em última análise, transformar a instituição ministerial em um novo poder soberano e sem qualquer controle externo, numa evidente afronta aos mecanismos de freios e contrapesos que balizam a própria organização do Estado.
Mais do que uma flagrante inconstitucionalidade, um abuso.
Principalmente ao se verificar projetos de lei de iniciativa e autoria do PGJ do Estado, propondo a criação não só de cargos até aqui anômalos na instituição e já existentes no Estado, pura concorrência, mas principalmente ao estabelecer funções e atribuições não contempladas na Carta Magna ao MP.
Tarefa de constituinte não pode ser exercida pelo procurador-geral de Justiça no Estado.
Onde diz a Constituição da República ou mesmo a do Estado, que ao Ministério Público competirá a realização das perícias judiciais ou nos processos em que o órgão atuar?
Como fica o princípio da ampla defesa, do contraditório, do devido processo legal e principalmente o do equilíbrio entre acusação e defesa?
Como é cediço, a Carta Magna de 1988 foi expressa ao estabelecer, em seu artigo 129, o rol taxativo das funções do Ministério Público.
Destarte, a própria Lei Orgânica do Ministério Público (Lei 8.625/1993), nos artigos 25 e 26, simplesmente não prevê, no rol das prerrogativas funcionais do órgão, tais competências, sistemática esta que foi por fim consagrada quando da edição da Lei Complementar 75/1993 que regulamenta o Ministério Público da União, cujo artigo 7º é inequívoco ao estipular que compete ao membro do Ministério Público requisitar à autoridade policial as diligências investigatórias.
Diante disso, como se conceber que o órgão acusador produza as perícias e os laudos periciais a seu bel interesse?
Que julgamento nessas condições poderá ser tido como justo?
Alto lá! Esse discurso do faça o que eu mando e não o que eu faço não pode balizar uma instituição que se diz séria e que acreditamos ser séria.
O mesmo serve ao conceito de informação para segurança pública. Que aliás, registre-se tratar de atribuição de atividade meio e não fim, como equivocadamente muitos pensam e, por isso deve se subordinar ao Sisbin (Sistema Brasileiro de Inteligência).
Nenhum Estado Democrático de Direito suportaria mais uma agência de espionagem institucional, principalmente sem um rígido controle externo, social e judicial.
Se por algum desastre vingar a ideia, haverá uma absoluta interferência e total desequilíbrio entre a defesa e a acusação, e para as garantias fundamentais constitucionais, além de um enorme prejuízo relativamente ao controle jurisdicional.
Sustentar entendimento diverso, “data máxima vênia”, corresponde verdadeira afronta ao princípio da reserva legal, conquanto inexiste tais prerrogativas funcionais aos mandatários ministeriais, sendo certo que por força do princípio da “previsão residual” instituída pela Constituição Federal em seu artigo 129, inciso IX, tal iniciativa por parte do sr procurador geral de Justiça do Estado de São Paulo se encontra fulminada pela inconstitucionalidade já em seu nascedouro, o que induz à sua liminar rejeição pela Assembleia Legislativa paulista.
Sem falarmos que, do ponto de vista daqueles que sempre lutaram pela independência da perícia, seria um retrocesso sem precedentes.
Especialmente porque, justamente em São Paulo, o Instituto de Criminalística — IC, alcançou essa autonomia funcional, mesmo sem ter a menor condição administrativa, física e material, sob o comando de um promotor na Secretaria de Segurança Pública.
A nossa sociedade, que tem se notabilizado pelas mobilizações e manifestações contra abusos e desmandos de toda ordem, tem mais uma bandeira para empunhar.
Quem se opôs à PEC 37 por entender, mesmo que equivocadamente, tratar-se da "PEC da impunidade", por coerência, tem que lutar com muito mais razão, contra essa arbitrariedade que afronta o Estado Democrático de Direito.
Totalitarismo institucional jamais!

Romeu Tuma Jr. é advogado, delegado de polícia aposentado e ex-secretário nacional de Justiça.
Revista Consultor Jurídico, 15 de julho de 2013

Nenhum comentário:

Postar um comentário